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AnáliseRicardo #30 – Anora é uma primorosa jornada de personagem

anora ricardo

• Uma comédia romântica caótica

Sean Baker, o cara que começou a chamar a atenção filmando com um celular, agora tá de volta com mais um filme que promete dar o que falar. Anora já chegou cheio de hype, mas será que o longa realmente entrega? Ou é só barulho? Bora descobrir agora!

Se você ainda não me conhece, prazer! Eu sou o Ricardo Gomes, jornalista e aquele cara curioso que gosta de destrinchar o que tá por trás das obras no cinema. Hoje a gente vai falar sobre o que pode ser o melhor filme da carreira do Sean Baker – ou pelo menos, o meu favorito até agora.

Eu confesso que tenho um relacionamento meio complicado com os filmes do Sean Baker. Tangerine? Curti bastante. Projeto Flórida? Nem tanto. Red Rocket? Interessante, mas não me pegou completamente. Agora, com Anora, fui surpreendido de um jeito que não esperava. Esse aqui tem tudo pra ser meu filme favorito do diretor.

Se você acompanha o meu canal, já sabe que eu adoro comédias românticas – a lista de melhores do ano mostra isso. Então, quando Anora começou com uma vibe meio Uma Linda Mulher, eu já tava vendido. Não só porque é comédia romântica, mas porque o Sean Baker consegue evitar aquele caminho batido que muitos diretores americanos seguem.

Ele pega personagens que normalmente seriam ignorados ou moralizados demais nos filmes de Hollywood e dá pra eles um espaço de verdade, sem julgamentos pesados. É isso que eu curto nele, e Anora não foge à regra.

Os primeiros 40 minutos são puro suco de comédia romântica leve e divertida. É o tipo de filme que te faz sorrir e até soltar umas risadas no meio do caminho. E dá pra ver que a equipe sabia exatamente o que queria passar.

A trilha sonora do Joseph Capalbo e a edição do próprio Sean Baker criam esse clima leve, mas é tudo muito bem planejado. E aí vem a sacada: quando o filme resolve sair desse estilo e cair no caos puro, ele faz isso no mesmo ritmo, sem quebras bruscas.

A fotografia do Drew Daniels também muda com as situações, passeando do neon para o clima mais erótico do clube, a coloração mais quente para passar a sensação de conforto e, a partir do ponto de virada, o azul para trazer de volta a realidade fria que a nossa protagonista tá encarando agora.

Mark Eydelshteyn e Mikey Madison

Agora, bora falar da estrela do filme: Mikey Madison. Que atuação! A Ani tem uma ingenuidade que tá escrita no roteiro, mas é a interpretação da Mikey faz a gente se conectar de verdade com a personagem.

E o mais interessante? Eu me peguei torcendo pra que ela “se desse bem” – mesmo sabendo que o caminho dela é complicado. Esse é o poder do roteiro e da atuação: te colocar na cabeça de alguém e fazer você questionar suas próprias expectativas.

Só que não é o padrão norte-americano simples e puro. Temos aqui um jogo de controle e poder que torna essa jornada completamente caótica. Enquanto você acha que tá conseguindo dinheiro pelo que você mesmo tá fazendo, você não pode perder o seu controle sobre o dinheiro, não pode deixar ele te controlar.

É forte o que a gente recebe aqui, tá?

A jornada de Ani, que tinha o total controle de si em seu trabalho, acaba sendo tirada por ela mesmo enquanto ela acreditava estar, finalmente, escapando daquela realidade. Saindo como? Com o dinheiro de uma família milionária e tradicional? Cê acha que por ela ser uma stripper isso iria acontecer de boa?

A partir do seu casamento, a protagonista não tem mais controle nenhum sobre a sua vida. Sobre como olham para ela, sobre como tocam nela, sobre como projetam o seu próprio futuro. Seja pelo garoto mimado que casou com ela, seja pela família desse garoto ou mesmo pelos atos que os capangas contratados dessa família tem.

Isso resulta em uma das cenas mais impactantes do filme, que é simples, simples e impactante. Uma cena em que ela busca poder sobre si mais uma vez e, o ato do seu parceiro tentar quebrar isso com um beijo mesmo, a faz lembrar que ela não tem controle de nada dali para frente, mas agora ela já sabe disso.

Isso aqui é o desenvolvimento pessoal de um personagem do melhor jeito. Escrito e dirigido de uma forma gigantesca por Sean Baker. Atuado de forma primorosa pela Mickey Madison.

O que eu mais gosto em Anora é como Sean Baker desconstrói o sonho americano. Ele dá voz a pessoas que geralmente não têm espaço nos filmes de Hollywood e faz isso com maestria. A jornada da protagonista é caótica, mas incrivelmente humana.

Anora não é só uma comédia romântica sensacional. O filme não tem medo de mergulhar no que pode, e que muitas vezes deve, fazendo isso de uma forma primorosa. Filmaralhasso.

 

Ricardo Gomes
O Sharkboy que se formou em Jornalismo e ama o cinema

 

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Este texto faz parte de um quadro de colaborações com outros redatores. O artigo não foi escrito pelo maravilhoso Luiz Felipe Mendes, dono do blog, e não necessariamente está alinhado às ideias dele.

Publicado por Ricardo Gomes

O cara que mais perde tempo assistindo TV e escrevendo sobre, segundo Michelle (minha gata).