• Criadores dos próprios méritos
Fazia muito tempo que eu tinha visto a primeira temporada de 3%. Eu lembrava bem de alguns acontecimentos importantes, como Michele e Rafael sendo da Causa, a tragédia envolvendo a esposa do Ezequiel, a lição de vida sofrida pelo Marco… mas não me recordava de outros igualmente essenciais. Por esse motivo, eu e minha namorada fomos assistir novamente e assim nos preparamos para a segunda temporada. Fico grato por isso, pois com tudo fresco na mente as coisas consequentemente fizeram mais sentido. Antes de iniciar o pitaco, vou só reforçar algo que eu sempre sublinho aqui no blog: eu não escrevo spoilers das obras em questão sem sinalizar; entretanto, se eu tô falando da segunda temporada de uma série, o texto terá spoilers da primeira. Estejam avisados.
Sinopse
Joana e Fernando reprovaram no Processo. A jovem optou por não matar um desafeto de seu passado recente e foi punida por não ter a “coragem” necessária. O jovem foi enganado pelas ilusões do amor e eliminado porque achou que sua possível futura namorada tinha ido embora do local. Ambos estão juntos no Lado de Cá, em busca de um novo propósito. Joana tenta encontrá-lo dentro das rebeliões da Causa, enquanto Fernando passa a viver sem uma lealdade específica e com dificuldades de reatar relações antigas, tal qual sua amizade com uma guria chamada Glória e o laço com seu pai fanático. No Lado de Lá, Rafael e Michele vivem realidades diferentes. Ainda que sejam da Causa, o garoto se apaixona por uma habitante do Maralto, algo que pode complicar os seus planos. A garota segue em busca de libertar o irmão, preso por ter sido responsável pelo primeiro assassinato do paraíso, quase uma espécie de Caim (o que seria preocupante pra Michele). Diante de todo esse cenário, Ezequiel precisa lidar com a figura de Marcela, uma comandante obstinada e com traços sadísticos.
Crítica
Eu estava bem preocupado com a segunda temporada. É mais do que comum distopias começarem com uma proposta instigante e uma premissa recheada de possibilidades, e se perderem no meio do caminho porque o desenvolvimento nunca é tão legal quanto o início. Perdi as contas de quantas vezes vi isso acontecer, com Jogos Vorazes, Divergente e Maze Runner entre os exemplos. Por isso, as chances de que 3% descarrilasse depois que o Processo dos personagens principais acabou era gigantesca. Isso acontece porque os “inimigos” distópicos são sempre os mesmos, representados por algum sistema autoritário, acarretando em algum tipo de rebelião que destrona o governo e coroa os rebeldes, os quais por sua vez costumam ser tão falhos quanto aqueles que combatem.
3% ganha pontos por não se prender a esse tipo de trama previsível. O enredo deixa claro os defeitos da Causa e os problemas do Maralto, mas não endeusa o primeiro e condena o segundo excessivamente. Além disso, não foca a história somente no combate entre os lados, pois se concentra também nos dramas pessoais dos personagens. Os atores que os representam não são lá os melhores, mas em geral cumprem bem os seus papeis. Os diferentes arcos têm algo a oferecer, e apresentam um futuro interessante para a saga.
Porém, a quantidade de defeitos é o suficiente pra fazer com que a segunda temporada seja um pouquinho inferior à primeira. O nível de ação tá um pouco menos bem dosado e a quantidade de falhas e conveniências tá consideravelmente maior. Em incontáveis ocasiões, o roteiro utiliza artifícios baratos pra que a história ande. Como assim, Leleco? Imagine uma situação impossível. Uma pessoa está fugindo da polícia e se vê encurralada em uma sala sem janelas. A prisão está prestes a acontecer, até que a pessoa percebe que há uma porta secreta que a tira dali. As conveniências que mencionei são nada menos do que o ato de uma obra colocar alguém em uma situação impossível e então dar uma solução boba. É como se 3% criasse momentos em que precisasse tomar decisões drásticas, mas não soubesse como fazê-las.
Veredito
O grande mérito de 3% é oferecer um pinguinho de originalidade dentro de um gênero que não costuma oferecer muita. A segunda temporada comete erros bobos e que poderiam ser evitados com um pouco mais de cuidado na escrita, o que acaba sendo frustrante. A série conseguiu o mais difícil, dar uma boa continuidade a uma premissa distópica, mas falhou no mais simples, promover uma sensação de realidade na ficção. Os personagens entregam núcleos em geral interessantes, ainda que as interpretações não sejam exatamente sublimes, e a jornada da trama principal é um pouco batida, mas nos dá vontade de degustá-la. A segunda temporada deixa claro o potencial do produto, ao mesmo tempo que expõe armadilhas que ele mesmo cria e cai. É uma boa diversão que poderia ser um verdadeiro marco para nós, brasileiros, como La Casa de Papel é para os espanhóis. Contudo, não consegue chegar tão longe assim. Nota final: 3,4/5.
>> Crítica da 1ª Temporada de 3%
Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco
Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco
Nota nº 3: bateu aquela curiosidade de saber qual exatamente é a nota das temporadas, sem arredondamentos? Se sim, dá uma olhada aqui nesse link. Se não, pode dar uma olhada também: Gabarito do Leleco
Nota nº 4: pra saber sobre quais séries e temporadas eu já fiz críticas no blog, é só clicar aqui: Guia do Leleco
~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO A TEMPORADA INTEIRA. O AVISO ESTÁ DADO ~
- Vou fazer as observações tomando como base as falhas de roteiro que encontrei junto à minha namorada. Pra começar, que mira ruim a do Silas, né? Ele tava atirando na Michele e conseguiu errar várias vezes, mesmo estando a pouca distância.
- No exato momento em que a guarda iria olhar a mochila do Fernando, um outro homem passou assoviando e ela desistiu de revistar o garoto. Isso é que eu chamo de timing.
- O Rafael tava lá em seu posto, e bem na hora a Ivana, uma das líderes da Causa (fiquei triste com a morte dela pelas mãos de seu aluno, inclusive), passou por perto e fez com que ele fosse atrás da mesma. Ela poderia ter passado por lá em qualquer parte do dia, mas foi especificamente naquela. E pra piorar, algumas cenas depois os dois, mais Joana, Fernando e Michele, estavam no mesmo lugar. Sei que aquele galpão era um esconderijo da Causa, mas com certeza não era o único. Muita coincidência terem escolhido o mesmo destino.
- Não entendi a Joana desenhando um mapa pra entrar na casa do Gerson. Se ela conhecia a residência, pra que diabos fez um mapa? E pior, ela ficou olhando pro mapa pra se guiar, sendo que era apenas um bando de rabiscos irregulares. Aliás, que personagem fraquinho aquele Gerson, né? Fiquei nem um pouco abalado por ele ter morrido. Pelo menos o Marco/Manco tem mais personalidade.
- Conseguiram meio que estragar o Ezequiel. O massa dele era todo o rolê de não sabermos de que lado ele tava, ou melhor ainda, pensar que poderia simplesmente estar do próprio lado, não apoiando totalmente o Maralto e nem a Causa. O fato de ele o tempo todo ter sido secretamente leal à Causa foi bastante forçado. E o cara morreu portando uma arma! Quando a Marcela começou a vir lentamente pra cima dele, era só sacar a peça e meter bala nela, sem neura. Em vez disso, ele ficou lá paradão, esperando pela morte. Ainda teve aquela parte em que Joana, Michele e Silas estavam encurralados, e Ezequiel chegou na velocidade da luz pra salvá-los. Pra completar, a Cássia e a Marcela entraram no escritório do Chefe do Processo no instante mais decisivo. É uma coincidência atrás da outra.
- Quando Michele e André estavam fugindo das autoridades, eles lembraram do registro instalado na cabeça bem na hora que a galera tava chegando perto, literalmente na cena seguinte. São timings perfeitos demais.
- Sobre a morte do Silas, não era mais fácil a Joana só tê-lo empurrado pro poço ao invés de se jogar junto? E puta merda, foi muita sorte ela não ter encostado em um ÚNICO sapo.
- O Fernando conseguindo escapar das câmeras porque Marcela e Marco se distraíram com a milícia quando ele tava passando beirou a comicidade.
- Michele, quando tava descobrindo a verdade sobre o Trisal Fundador, abriu a frequência de rádios justamente na que tinha o Rafael, o Fernando e a Joana conversando. Isso é o que eu chamo de sorte.
- Posso ter perdido isso, mas como o Rafael conseguiu o anel da Júlia, esposa do Ezequiel? Confesso que não compreendi.
- Quero até ver se a terceira via proposta pela Michele vai funcionar. Obviamente que não, mas tomara que a próxima temporada esteja mais atenta contra os deslizes citados neste pitaco. Não custa sonhar.
~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~
+ Melhor personagem: Fernando
Por essa ninguém esperava. Eu não tinha gostado tanto dele na primeira temporada, mas na segunda teve uma personalidade mais firme e questionadora, sendo responsável por vários momentos marcantes.
+ Melhor episódio: T02E04 (“Guardanapo”)
A partir daqui, a temporada foi elevada a um novo patamar. O quarto e o quinto capítulos são ambos muito bons, e consolidaram uma certa maturidade.
+ Maior decepção: Marcela
Tinha tudo pra ser uma boa vilã, mas infelizmente sua construção foi bem fraquinha. Ela foi colocada de forma abrupta na trama e não conseguiu exprimir o carisma necessário pra superar Ezequiel no papel de antagonista central.
Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou da temporada. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?