Mistério, Séries

Boneca Russa: 1ª Temporada (2019)

• O reflexo do déjà-vu

Gotta get up, gotta get out, gotta get home before the morning comes.
Eu amo loops temporais. No Limite do AmanhãA Morte te dá Parabéns, o episódio 11 da terceira temporada de Supernatural… não sei dizer o que exatamente me fascina na repetição de acontecimentos, só sei que sempre captou a minha atenção. Assim que eu assisti ao trailer de Boneca Russa na época de seu lançamento, a minha curiosidade foi atiçada e eu quase me vi dando play no primeiro episódio e iniciando mais uma maratona. Resisti à tentação por me lembrar da quantidade de séries acumuladas implorando para serem finalizadas, e acabei me esquecendo do assunto. Meses depois, resolvi fazer uma sessão de filmes de terror na casa da minha namorada em pleno Dia dos Namorados. Assistimos O Exorcismo de Emily Rose e decidimos que seria melhor se investíssemos o restante da madrugada em alguma coisa mais, hm, tranquila. Analisamos as listas de cada um na Netflix e encontramos Boneca Russa entre as opções. Por que não dar uma chance?, pensamos. E demos.

 

Sinopse

Imagina uma festa de aniversário sua. Você está curtindo a noite do jeito que pode, até que de repente… você morre. Normalmente, isto seria o fim, certo? Errado! Bom, pelo menos no caso de Nadia Vulvokov. Em sua comemoração de 36 anos, ela participa da cerimônia na casa de uma amiga e em certo momento sai pelas ruas procurando por seu gato desaparecido. Nadia consegue encontrá-lo, mas acaba morrendo no processo. Logo em seguida, a mulher acorda novamente em sua festa de aniversário, olhando o seu próprio reflexo através do espelho do banheiro da amiga. Hesitante, ela considera que aquele delírio foi provavelmente um surto de sua cabeça, até que os acontecimentos começam a se repetir, deixando-na mais confusa do que nunca.

Suas definições de “rolê aleatório” foram atualizadas

Crítica

Em toda a minha experiência com histórias envolvendo loops temporais, descobri que o segredo está nos detalhes. A questão não é ficar de olho no que está igual, mas sim no que ficou diferente. Iniciei minha tarefa com empolgação, esperando ser fisgado e ficar de olhos fixos na televisão durante toda a madrugada. A acidez da protagonista Nadia era interessante o bastante para utilizar como ponto de partida, e os personagens secundários não ficavam muito atrás. Maxine e Lizzy são as amigas festeiras de Nadia, John Reyes é o seu ex-quase-futuro marido, Cavalo o enigmático morador de rua da região, Mike Kershaw o cafajeste fanfarrão, Ferran o simpático atendente de uma loja do bairro, Ruth a compreensiva avó. Boneca Russa parecia ter uma sólida base para deslanchar com sua trama, apresentando um conceito de repetição agindo como catalisador de uma exaustão da protagonista.
A estratégia é bem desenhada, e faz sentido com a proposta da série. O grande problema é que, para uma obra com apenas oito episódios de mais ou menos 25 minutos cada, Boneca Russa é um pouco enjoativa. É estranho dizer isso depois de ver que a maioria das críticas afirmou que a temporada é justamente o contrário, mas a impressão que ficou comigo constantemente foi de que eu já tinha visto aquilo antes – não no sentido do loop proposital, mas da falta de originalidade. A variação de cenários foi mínima pra mim, e eu tava ficando um tanto quanto cansado até o momento que o personagem de Alan Zaveri entrou na jogada. Naquele instante, a série ganhou um novo fôlego e decolou, ainda que a mudança de tom na reta final tenha me causado um pouco de estranheza; a narrativa bem-humorada e sarcástica subitamente ganhou contornos soturnos e dramáticos.
O elenco é obviamente talentoso, encabeçado por Natasha Lyonne, a qual também é a criadora da série ao lado de Amy Poehler e Leslye Headland. Os diálogos são espertos, as piadas bem colocadas, e o roteiro consegue aproveitar as características de cada personagem. Eu senti falta de uma certa imprevisibilidade durante a trama, no entanto. Com exceção de certo acontecimento no meio da temporada e o capítulo final em si, achei até que a série caminhou por estradas trafegadas várias vezes antes. Pra mim, faltou explorar um pouco mais da vida de Nadia em outros ambientes, deixá-la viva por mais tempo antes de reiniciar o ciclo intermitente. Quando eu achava que Boneca Russa me apresentaria algo de diferente, tudo voltava ao estágio inicial. Tenho consciência de que a proposta da série foi fazer com que sentíssemos as mesmas coisas da protagonista, mas isso nem sempre é um ponto positivo se a experiência acaba sendo cansativa.

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Sinopse

Apesar de eu ter listado diversos problemas que encontrei ao longo da série, não se enganem: Boneca Russa vale a maratona. O diferencial da obra em relação a outras companheiras do gênero é o tom ácido com que conta sua história e o ambiente de desconforto que, embora tenha sido um pouco demais pro meu gosto, pode contribuir para uma experiência mais completa dependendo do espectador. O ponto de virada do terceiro capítulo é daqueles que nos fazem ajeitar o corpo no assento e levantar as sobrancelhas mergulhadas em expectativa, e os desdobramentos do episódio final são como um soco no estômago. O desfecho é perfeito e poderia tranquilamente ter sido o encerramento da série, mas esta foi renovada para uma segunda temporada. Não sei o que será do enredo a partir daí, mas confesso estar no mínimo curioso pelas próximas provocações. Nota final: 3,6/5.

Dá pra sentir os olhares de descontentamento

 

Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco

Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco

Nota nº 3: bateu aquela curiosidade de saber qual exatamente é a nota das temporadas, sem arredondamentos? Se sim, dá uma olhada aqui nesse link. Se não, pode dar uma olhada também: Gabarito do Leleco

Nota nº 4: pra saber sobre quais séries e temporadas eu já fiz críticas no blog, é só clicar aqui: Guia do Leleco

 

~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO A TEMPORADA INTEIRA. O AVISO ESTÁ DADO ~

 

  • Não vou mentir, eu e minha namorada ficamos literalmente boquiabertos quando o Alan falou pra Nadia no elevador que não se importava com a queda, pois morria a todo momento. A cena de ambos se olhando enquanto o elevador despencava foi de tirar o fôlego, e a única coisa que eu conseguia pensar era em clicar logo pra ver o episódio seguinte.
  • A série ficando lúgubre nos últimos capítulos foi tipo a segunda metade de Click. Sério, ela era toda alegrezinha e engraçada e do nada tava mostrando a mãe da Nadia, Lenora, enlouquecendo e quebrando os espelhos da casa, comprando infinitas melancias e sendo uma cuidadora terrível. Nos primeiros episódios, a gente tinha a Nadia morrendo atropelada, caindo da escada ou estando no centro de uma explosão de gás. No fim, ela estava tendo visões dela mesma quando criança, assombrada pelas memórias do passado, enquanto frutas, animais e pessoas sumiam e murchavam ao seu redor nos tempos atuais. Aquela cena em que a Nadia começa a passar mal na frente da filha do John foi forte demais.
  • Eu pensava que o Cavalo seria mais importante, na moral. Acabou que ele só serviu pra cortar o cabelo da Nadia em uma das linhas do tempo, ser pedido em casamento pelo Alan e em seguida roubar as suas coisas na linha do tempo original. Acho que poderiam tê-lo aproveitado um pouco melhor.
  • O Ferran é mó gente boa, né? Ajudou o amigo passando mal em sua loja e tudo mais. É uma pena que isso não evitou que Alan se suicidasse naquela mesma noite, se jogando de um prédio.
  • Demorei a temporada inteira pra saber qual era a daquele John. Eu jurava que ele fosse ex-marido da Nadia, mas acabou que na verdade o cara tinha uma esposa, a traiu com a Nadia, largou a esposa pra ficar com a Nadia e a Nadia acabou nem ficando com ele no final das contas. É isso mesmo ou continuo tendo entendido errado? Ficou meio confuso pra mim.
  • Ô, vontade de dar um chute na barriga (pra não dizer em outro lugar) do Mike. Ele é o tipo de cara que eu desprezo: paga de pegador, é arrogante e acha que é a última Coca-Cola do deserto. Se eu fosse o Alan, teria dado uma surra nele em todas as linhas do tempo, só pelo gostinho. Afinal de contas, tudo seria reiniciado mesmo, né? E foi paia também a ex-quase-futura noiva do Alan, Beatrice, ter feito aquilo com ele, mesmo que o Alan fosse sistemático (e chatinho de se conviver) ao extremo.
  • Certo, as linhas do tempo de Nadia e Alan se fundiram em uma só? Eles ainda continuam separados por dimensões? A Nadia do passado ficará pra sempre com o Alan do presente, e o Alan do passado com a Nadia do presente? As mortes continuarão acontecendo após um tempo? A natureza está balanceada novamente, ou é algo temporário? Por que os loops ocorreram logo com a Nadia e o Alan? A única explicação é a de que ambos precisavam ajudar um ao outro, em uma espécie de lição do universo, ou tem algo a mais por trás? Será que tem a ver com o a mãe da Nadia e o fato da filha tê-la “superado” na idade? Qual vai ser a trama principal da segunda temporada, teremos mais loops? Perguntas, perguntas e mais perguntas. É o que fica pra gente agora.

 

~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~

 

+ Melhor personagem: Nadia Vulvokov
A atriz Natasha Lyonne, de Orange Is The New Black, sustenta o protagonismo com tranquilidade e nos entrega uma personagem carismática e com capacidade de desenvolver distintas relações com os demais personagens. Alan Zaveri também é bastante interessante.

Segundas-Feiras: Um Resumo

+ Melhor episódio: S01E03 (“A Warm Body”)
Até este momento, a série ainda não havia dado pistas do que seria a trama principal. Ok, a mulher não parava de reviver a mesma noite, mas… e aí? Ficaria naquilo pra sempre? Ao final do terceiro episódio, a história virou de cabeça pra baixo – e foi o melhor momento da temporada.

Quartas-Feiras: A Semana Começa a Melhorar

 

Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou da temporada. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?

Publicado por Luiz Felipe Mendes

Fundador do blog Pitacos do Leleco e referência internacional no mundo do entretenimento (com alguns poucos exageros, é claro).