Artigos/Especiais, Colaborações

AnáliseSylvester #01 – Sam Raimi x Marc Webb

• Por que a primeira trilogia do Homem-Aranha é melhor do que a duologia Espetacular?

Um breve balanço entre as duas franquias para mostrar por que Sam Raimi fez um trabalho difícil de ser superado

O Homem-Aranha é, sem dúvidas, um dos heróis mais conhecidos e queridos do público. Criado por Stan Lee e Steve Ditko, o personagem da editora Marvel surgiu nos quadrinhos em 1962. A partir de então, passou por diversas outras mídias, como séries de TV, animações, jogos eletrônicos e, claro, pelas telonas. Até o momento tivemos seis filmes solos do amigão da vizinhança (além desses o personagem participou também de Capitão América: Guerra Civil e Vingadores: Guerra Infinita), os quais contribuíram para a sua popularização e representam juntos uma das franquias mais rentáveis da história. 

Mas o foco aqui será no período antes do acordo entre Disney/Marvel e Sony e antes de o Teioso entrar para Os Vingadores. Vamos nos concentrar na época em que os filmes de super-heróis estavam começando a ganhar espaço novamente. Para tanto, levaremos em conta apenas a primeira trilogia do Homem Aranha (2002-2007), dirigida por Sam Raimi, e os dois filmes da franquia Espetacular (2012-2014), dirigidos por Marc Webb. É inegável que cada saga teve suas qualidades e defeitos; entretanto, a trilogia de Raimi ainda é composta pelos melhores filmes do Homem-Aranha.

Em primeiro lugar, há uma clara diferença entre o Peter Parker dos filmes originais e o Peter Parker do primeiro reboot. No primeiro filme, Peter era um nerd tímido e desajeitado; tinha medo de falar com a Mary Jane e sofria bullying calado. Já em O Espetacular Homem Aranha, Peter era um tanto descolado. Além de ser inteligente e tirar as melhores notas, também usava lentes de contato, andava de skate e enfrentava os valentões – a diferença é que depois de ganhar os poderes ele conseguia efetivamente derrubá-los. Talvez fosse uma tentativa de atualizar a personalidade do protagonista para a nova geração, mas, seja como for, acabou fugindo do material fonte. Muitos dizem que o Peter de Tobey Maguire era muito estereotipado, só que isso não é necessariamente ruim. Vale ressaltar que não estamos aqui falando sobre os atores, mas sim os personagens. Até porque Andrew Garfield é um ator talentoso e, inclusive, já foi indicado ao Oscar.

Outro ponto que não podemos deixar de citar: vilões. É verdade que não foram todos os vilões da trilogia de Raimi que foram bem trabalhados (alguém aí pensou no Venom?!), porém, no geral, o primeiro Homem-Aranha do cinema teve vilões verdadeiramente interessantes e que deram trabalho para serem vencidos. Destaque para a memorável atuação de Willem Dafoe no primeiro filme, o qual interpretou Norman Osborn e seu alter ego, o Duende Verde. Foi cativante e até assustador ver a interação entre Norman e a voz na sua mente, uma espécie de subconsciente. E como o Homem-Aranha apanha do Duende Verde, principalmente na luta final do filme, que mostra sangue, explosão e um belo desfecho onde o Teioso usa o sentido aranha. Já o Doutor Octopus, em Homem Aranha 2, apesar de ter não ter batido tanto no herói, também deixou sua marca. Interpretado pelo grande Alfred Molina, o personagem mostrou como um homem bom pode se transformar em algo mau após sofrer tragédias pessoais, e como a relação entre homem e máquina pode ser perigosa. Sem mencionar o fato de que o Dr. Octopus e o Homem-Aranha protagonizaram a melhor cena de luta da trilogia e uma das melhores de todos os filmes de super-heróis, que foi a cena do trem.

Já nos dois filmes da franquia Espetacular, também tivemos vilões clássicos, mas infelizmente eles não convenceram. Citemos dois exemplos: Lagarto e Electro. O primeiro, interpretado por Rhys Ifans, sofreu muito com um CGI mal feito e com algumas mudanças em relação às HQs. No filme, o Dr. Curt Connors controla a mutação e até fala quando está transformado em Lagarto. Ele inclusive chega ao ponto de misturar fórmulas na escola quando vai atrás de Peter. Tudo isso tirou um pouco do peso do personagem. E quanto ao Electro? É uma pena que sua motivação não esteve à altura de seu visual. Um “cara” que decide praticar o crime porque fica com ciúmes da atenção que o Homem Aranha recebe está longe de ser uma motivação satisfatória. Mesmo antes de sofrer o acidente e ganhar os poderes, Maxwell Dillon já tinha problemas de autoestima e era bastante abobado, o que prejudicou o personagem. Um desperdício para o carismático Jamie Foxx, intérprete do vilão. Assim, com vilões bem construídos e que lidam com questões mais sérias, os três primeiros filmes mais uma vez vencem.

Chegamos ao terceiro motivo, que está ligado ao foco dado em cada franquia. Enquanto na trilogia com Maguire o protagonista lidava com os assuntos do presente, na saga com Garfield o herói era atormentado demais pelas coisas do passado. Uma das premissas de O Espetacular Homem Aranha era mostrar a história não contada, o que envolvia a verdade sobre os pais de Peter. Será que isso era realmente necessário? Parece que o diretor e os roteiristas queriam justificar a existência do Homem Aranha, pois mostraram que toda a pesquisa com as aranhas geneticamente modificadas começou com o pai dele, Richard Parker. Até deram a entender que o sangue do Homem-Aranha tinha “fator de cura”, pois em O Espetacular Homem Aranha: A Ameaça de Electro, Harry (Dane DeHaan) quis o sangue do herói para tentar curar sua doença hereditária. Além do mais, nos dois filmes de Marc Webb, era impressionante como todos os eventos – além do desaparecimento dos pais de Peter – estavam ligados à Oscorp. Foram muitas perguntas feitas para poucas respostas, e, no final das contas, a franquia foi cancelada após o segundo filme e mais adiante um novo reboot foi anunciado. A primeira trilogia não usou nenhum desses ganchos do passado de Peter; ela foi objetiva e mostrou o personagem enfrentando os desafios do agora. Isso não significa que não houve coincidências nos filmes de Raimi, mas também não foram no nível dos dois filmes de Webb.

Não podemos negar que cada uma das franquias tem a sua legião de fãs. Por exemplo, muitos torcem o nariz para o jeito chorão de Tobey Maguire e preferem a personalidade mais ativa de Andrew Garfield. Além disso, é quase uma unanimidade que Homem-Aranha 3 perdeu bastante a qualidade de seus antecessores, em boa parte devido à dancinha de Peter nas calçadas.  Embora o terceiro filme de Raimi tenha sido um tanto quanto decepcionante, a franquia tem um saldo positivo e se mantém até hoje no coração de vários e vários fãs. Estava confirmado ainda um quarto filme, que traria o Abutre como o novo vilão, mas os problemas entre o diretor e o estúdio (que já haviam começado na produção de Homem-Aranha 3) se agravaram  e o projeto foi cancelado. Alguns anos depois, em julho de 2012, seria lançado O Espetacular Homem Aranha, primeiro reboot cinematográfico do aracnídeo.

Se X-Men deu um empurrão na porta para instigar a produção de filmes de super-heróis, no ano 2000, foi Homem-Aranha que abriu essa porta de vez, em 2002. Um filme divertido, que uniu bons atores e ótimos personagens, e que trouxe efeitos especiais impressionantes. Foi envolvente, emocionante, foi lucrativo e até hoje nos faz arrepiar (lembra da cena final em Homem-Aranha, onde Peter pensa consigo mesmo: “quem sou eu? Eu sou o Homem Aranha!”). A sequência não ficou atrás; pelo contrário, superou o filme de origem e é um dos melhores filmes de heróis da história. Já o terceiro filme… Bem, é aquilo que comentamos no parágrafo anterior. Independentemente disso, a franquia Homem-Aranha mostrou o personagem como ele verdadeiramente é: batalhador, sem dinheiro para pagar as contas, não pode ficar com a mulher que ama, tentando conciliar sua vida pessoal com suas obrigações de herói, e indo literalmente até o limite de suas forças a fim de salvar quem precisa. É, com certeza, o amigão da vizinhança! Sam Raimi e Tobey Maguire serão sempre lembrados.

.

Sylvester Carvalho
Estudante de Jornalismo. Amante de filmes e séries. Grande fã do Homem-Aranha

.

Este texto faz parte de um novo quadro de colaborações com outros redatores. O artigo não foi escrito por Luiz Felipe Mendes, o dono do blog.

Publicado por Luiz Felipe Mendes

Fundador do blog Pitacos do Leleco e referência internacional no mundo do entretenimento (com alguns poucos exageros, é claro).