Drama, Séries

Orange Is The New Black: 1ª Temporada (2013)

• Animais na jaula

O ano é 2013. Na política, o Brasil ainda não havia se polarizado totalmente. No futebol, a nossa seleção derrotaria a Espanha na final da Copa das Confederações e encheria seu povo de esperança pelo hexacampeonato da Copa do Mundo. No cinema, O Homem de Aço dava início ao Universo Estendido da DC e O Lobo de Wall Street marcava uma das maiores atuações da carreira de Leonardo DiCaprio. A vida era boa. Naquele mesmo ano, a Netflix lançaria as suas primeiras séries originais. A terceira delas foi Orange Is The New Black, com uma proposta ousada de abordar as vidas de diversas prisioneiras, em uma história baseada em fatos reais. A produção marcou época e foi essencial na consolidação da Netflix como potência no ramo. Há dois anos, ela foi encerrada. Depois de tanto tempo, decidi iniciá-la para ver se valia a pena. Será que valeu? Só lendo o pitaco pra saber. Como se não tivesse escrito na imagem de capa, né

 

Sinopse

Piper Chapman é uma típica garota branca de classe média. Por fora, não há nada aparentemente notável em relação à sua personalidade. Educada e polida, está noiva de um homem chamado Larry Bloom, um dos nomes estadunidenses mais genéricos possíveis. Contudo, Piper esconde uma antiga vida aventureira. Em seu passado, ela se envolveu romanticamente com Alex Vause, uma traficante bem-sucedida que forneceu a Piper uma vida de extremo conforto na época. Eventualmente, a conta chega, e nossa protagonista decide se entregar à polícia por ter sido citada em um esquema de transporte de drogas. Com isso, Piper é sentenciada a 15 meses de prisão na Penitenciária Litchfield, e assim se inicia a sua jornada em meio a uma realidade desconhecida até então.

A palestra rolando solta e a galera fazendo Corrida Naruto lá atrás

Crítica

Eu não tinha muita noção do que se tratava Orange Is The New Black antes de começar a assistir. Eu sabia que a trama se passava em uma prisão, e que tinha casais lésbicos/sáficos. Ou seja, não sabia nadica de nada. Confesso que muita coisa foi diferente do que eu imaginava.

O primeiro elemento que me surpreendeu foi a protagonista. Eu não esperava que ela seria tão… certinha. A minha ideia da Piper era de uma mulher com duas vidas paralelas, mas bastante consciente de suas falhas. Eu não esperava que ela seria presa por algo de muitos anos antes. De certa forma, isso foi bom e ruim. A personagem de Piper é entediante no começo. Ela acha que a prisão é uma espécie de colônia de férias, em que há regras muito bem estabelecidas e onde a ética sempre prevalece. Isso fez com que eu rolasse os olhos a cada momento em que ela dizia algo ingênuo, mas era exatamente assim que o roteiro desejava que eu me sentisse. Orange Is The New Black se transforma então em um manual de como a cadeia muda uma pessoa, ou simplesmente traz à tona suas características mais selvagens e primitivas. Caso contrário, um ser humano pode facilmente ser quebrado em um ambiente nocivo como aquele.

Nessa mesma linha de raciocínio, Orange Is The New Black é um ótimo estudo de personagens, mas com alguns poréns. A série começa sem saber exatamente quais as suas intenções. Ela flerta com a comédia, investe no drama, mas fica no meio do caminho e causa um pouco de estranhamento. Aos poucos, no entanto, a obra se encontra. A cada episódio, o passado de uma personagem é explorado, para que possamos entender o que fez com que as ditas cujas fossem condenadas. É uma estratégia perigosa, porque pode tranquilamente banalizar o crime e tratar quem os comete apenas como vítimas. A série tenta não fazer isso, mas acaba escorregando em certas histórias. Ainda que mostre os delitos sendo cometidos, Orange Is The New Black se esforça tanto para mostrar todos os lados de uma situação que os crimes parecem muito pequenos, ainda mais porque a obra fornece muito carisma às personagens. É como se todas as prisioneiras tivessem sido, de alguma forma, injustiçadas, o que é pra lá de controverso. Espero que tenham corrigido isso nas temporadas subsequentes.

Deixando essa problemática de lado, não dá pra dizer que a série não sabe bem como fazer o público se identificar com suas personagens. Todas elas possuem identidades muito fortes, e arcos igualmente sólidos. A trajetória da protagonista é um círculo completo, e as coadjuvantes se mostram tão presentes que frequentemente surge uma ilusão de protagonismo que só faz bem à história. Os “vilões” são um pouco caricatos, mas funcionam bem no contexto da obra e nos passam todos os sentimentos de revolta que deveríamos sentir. Gostaria que os antagonistas fossem mais explorados futuramente, para que de fato possamos ver todos os lados das situações. Obviamente, isso não vai justificar tudo o que fizeram de errado, mas seria legal ver um pouco mais de profundidade e não apenas o “cara abusivo”, a “diretora egoísta”, o “agente hipócrita” e por aí vai. Enquanto as prisioneiras ganham múltiplas camadas, os responsáveis pela manutenção da penitenciária são bem mais vazios.

A duração longa dos episódios tinha tudo pra deixar a experiência cansativa, mas não é isso que acontece. Os acontecimentos são fluidos e a narrativa pula de personagem em personagem, motivando-nos a clicar no próximo capítulo para que possamos conhecer um novo viés. Com o tempo, a série aprende a dosar muito bem a comédia e o drama, sem tirar o espaço de nenhum dos dois. A progressão dos acontecimentos é sustentado pelo ritmo da narrativa, e a direção consegue espelhar assertivamente em tela o que as personagens estão sentindo. Se o episódio é focado na Piper e ela está com raiva, a direção conduz a trama raivosamente. Se a Piper está feliz, o capítulo ganha contornos mais alegres, e assim por diante.

MasterChef Litchfield: Jacquin, Paola e Fogaça

Veredito

Orange Is The New Black é uma comédia dramática que, inicialmente, demora um pouco a entender como dosar os dois gêneros. Quando consegue, o resultado é excelente. As personagens são carismáticas e profundas, e o cenário narrativo das mesmas é instigante, embora careça de um pouco mais de imparcialidade. A série é capaz de nos fazer imergir completamente no mundo de Litchfield, e, quando as atenções são direcionadas para alguma ocorrência fora dos muros da penitenciária, é como se fôssemos recebidos com um suave sopro de liberdade. É possível sentir a agonia de cada personagem, e inevitavelmente torcemos pela grande maioria delas. A ambientação é eficiente e a obra promete muitas outras tramas para o futuro, e eu mal posso esperar para conhecê-las. Nota final: 4,0/5.

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Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco

Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco

Nota nº 3: bateu aquela curiosidade de saber qual exatamente é a nota das temporadas, sem arredondamentos? Se sim, dá uma olhada aqui nesse link. Se não, pode dar uma olhada também: Gabarito do Leleco

Nota nº 4: pra saber sobre quais séries e temporadas eu já fiz críticas no blog, é só clicar aqui: Guia do Leleco

 

~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO A TEMPORADA INTEIRA. O AVISO ESTÁ DADO ~

 

  • A Piper me deu muita preguiça no começo, pqp. Que bosta foi aquela de ela esquecendo a chave de fenda no bolso e só depois percebendo? Por que ela não arremessou a ferramenta na grama na primeira oportunidade? Ai, ai. O pior é pensar que eu provavelmente seria igual a ela se fosse preso. Pelo menos a Piper mudou depois.
  • Na moral, fiquei com muita dó da Suzanne. Ok, no começo fiquei meio assim com ela por causa de todo o rolê envolvendo o xixi, mas quando ela perguntou à Piper o porquê de seu apelido ser Crazy Eyes, e depois que o Larry contou aquela história no rádio, fiquei com muita pena. Ninguém merece aquele tipo de tratamento.
  • É incrível o poder que a Red exerce sobre a prisão e, principalmente, sobre a cozinha. Foi só a Piper criticar a comida dela e a russa foi lá e colocou um absorvente usado no alimento. Sobre o flashback dela, não a julgo por ter estourado o silicone daquela outra mulher. Acho que é impossível julgar, né?
  • A Sophia é muito injustiçada, gostaria de ver mais dela. No começo, parecia que estaria presente em todos os principais núcleos, mas depois deu uma sumida. Pelo menos conseguiu de volta os seus remédios. Só discordei dela na questão envolvendo sua esposa, mas fora isso, tudo show.
  • Claudette, você sabe que todos nós passamos pano por você ter matado aquele maluco que maltratava a moça. E tomara que você consiga voltar pro seu amado <3
  • Eu passei a temporada inteira achando que o romance entre a Daya e o Bennett seria fingimento de um dos dois, mas acabou que eles realmente se apaixonaram um pelo outro. Ah, e foi barra a Daya ter que ficar com o Mendez pra justificar sua gravidez, mas foi um plano meio nada a ver. Se a Daya acusasse o Mendez de tê-la estuprado e feito um filho, a galera de Litchfield provavelmente pediria por um exame de DNA. Quando desse negativo, o caminho mais lógico seria fazer o exame com os agentes penitenciários. De qualquer forma, iria dar merda.
  • A Watson foi uma das personagens que eu mais gostei. Antes de conhecer sua backstory, não tava curtindo muito o jeito meio turrão dela, mas depois curti pra caramba. Ela desafiando o carinha lá, sendo jogada na solitária, ficando com raiva da Piper e depois conseguindo voltar a correr em uma pista foi bem massa de ver.
  • Esperava mais da Nicky, confesso. Ela é engraçada e tudo mais, mas parece que faltou algo. De qualquer forma, seus diálogos com a Morello depois de elas terem terminado foram muito bons, e sua relação com a Red também.
  • Cadê a galinha, meu pai???
  • A Alex é uma personagem com muito potencial, até porque eu adoro personagens com sarcasmo. Ela foi cuzona com a Piper por entregá-la e ainda agir como se nada tivesse acontecido, mas não dá pra esquecer que a Piper também foi fdp com ela, ao terminar o relacionamento logo após a Alex ter perdido a mãe. Foi pesado. O Larry segue o caminho inverso. Eu tava do lado dele na maior parte do tempo, mas ele não tinha o direito de sair contando as histórias da noiva sem consultá-la antes. Nisso ele vacilou.
  • Já quero um episódio centrado na Taystee e na Poussey. Melhor amizade.
  • Se eu já tava com raiva do Mendez por tudo que ele havia feito, fiquei ainda mais quando ele matou indiretamente a Tricia. Foi paia demais. Tudo bem que ele foi afastado do cargo, mas tenho certeza de que vai voltar ainda pior posteriormente.
  • A Gloria soltando a voz no último episódio foi sensacional. Não esperava por aquilo.
  • Cara, a Tiffany é uma representação perfeita de certas vertentes religiosas. Comumente, as pessoas que mais são contra algum tipo de atividade estiveram envolvidas de alguma forma nelas. A Tiffany teve cinco abortos, matou uma pessoa da clínica por pura birra e foi recebida de braços abertos pela comunidade contra o aborto. Isso sem falar na hipocrisia da situação. Eles são a favor da suposta vida de um bebê, mas aplaudem o assassinato de uma pessoa inocente. A arte imitando a vida!
  • O Sr. Healy enganou todo mundo direitinho, bicho. Eu achava que ele era o mais de boa daquela prisão, quando na verdade sua hipocrisia era uma das piores coisas de lá. O cara tem uma obsessão doentia por lésbicas, e ainda deixou a Piper pra morrer. Ainda bem que ela conseguiu se desvencilhar da Caipira e derrotá-la. Aliás, derrotá-la é pouco. Será que a Piper a matou?

 

~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~

 

+ Melhor personagem: Piper Chapman
Acho que muita gente pode discordar dessa escolha, inclusive minha namorada, que me apresentou a série. Pra mim, o que pesou foi a qualidade da jornada da protagonista. A sua lenta mudança de personalidade é natural e sem falhas, fazendo com que tenhamos duas visões totalmente diferentes de Piper entre o início e o fim da temporada. Para não deixar passar batido, a cozinheira Red também foi um dos grandes destaques.

Casal lindo e perfeito

+ Melhor episódio: S01E13 (“Can’t Fix Crazy”)
Entre todos os capítulos da temporada, três foram acima da média pra mim: o 10, o 11 e o 13, por motivos diferentes. Um provocou tristeza e revolta, o outro foi responsável por agitar o enredo e o último teve grandes emoções opostas. No frigir dos ovos, a season finale foi o ponto mais alto.

Diagnóstico: prisão de ventre

 

Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou da temporada. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?

Publicado por Luiz Felipe Mendes

Fundador do blog Pitacos do Leleco e referência internacional no mundo do entretenimento (com alguns poucos exageros, é claro).