• Seis ternos, quatro patas
O foco do Pitacos do Leleco sempre esteve mais nas séries. Nos últimos meses, no entanto, resolvi voltar os olhos um pouco mais pro mundo dos filmes, fazendo sessões especiais de postagens, mais especificamente sobre os longas da DC e da Marvel, além da trilogia do Batman dirigida pelo Christopher Nolan. Agora, é a vez de um novo leque de críticas, me desvinculando totalmente do mundo dos super-heróis. No próximo dia 15 de agosto, o renomado Quentin Tarantino lançará aqui no Brasil o seu nono filme como diretor, o penúltimo de sua carreira. Por isso, decidi fazer uma linha do tempo e passear por todos os capítulos da mente do brilhante cineasta, começando, é claro, pelo começo.
Sinopse
Oito caras, um assalto à joalheria. Parece um fragmento de Onze Homens e um Segredo ou algo do tipo, mas tá longe de ser grandioso assim. Em Cães de Aluguel, seis criminosos são contratados por um manda-chuva mafioso e seu filho, e aceitam participar de um roubo de diamantes. Até aí tudo bem (não é como eu definiria a situação, mas ok), o problema é que a coisa toda dá terrivelmente errado. A polícia é acionada, alguns dos assaltantes são baleados, outros desaparecem, e os sobreviventes se reúnem pouco a pouco em um armazém, o local de fuga que havia sido combinado. Intrigados, os remanescentes precisam descobrir o que diabos deu errado, nunca deixando de esquecer que muito provavelmente há algum informante entre eles.
Crítica
Eu não sei como eu demorei tanto pra assistir essa porra. Sério, antes de começar esta sessão tarantinesca eu só tinha visto Pulp Fiction, Bastardos Inglórios, Django Livre e Os Oito Odiados. O primeiro filme do diretor nunca me atraiu muito, não tinha curiosidade sequer de saber sobre o que era. Pensava comigo mesmo: ah, nem deve ser tão bom assim, não ouço tanta gente falando especificamente dele. Cara, como eu tava errado.
O filme me pegou logo na cena inicial, a qual apresenta um bando de marmanjos conversando sobre assuntos tão aleatórios que me fizeram pensar que eu tava lá dentro com minha roda de amigos. Os caras foram de Madonna a gorjetas numa velocidade tão rápida que não pude deixar de ficar encantado com a qualidade do roteiro. Esta é a maior prova de que diálogos bem escritos fazem a diferença: eu poderia ter ficado vendo duas horas ininterruptas daquilo. Aliás, a obra tem poucos cortes e longas cenas de conversas, que nas mãos de outros diretores poderiam ter ficado maçantes. Não é o caso.
A história caminha numa perspectiva linear em uma linha do tempo totalmente não-linear. O enredo tá lá concentrado nos acontecimentos atuais, e do nada ele passeia pelo passado, dividindo a coisa toda como se fossem capítulos de um livro. Os personagens principais são destrinchados e soam como pessoas reais, não apenas criações ficcionais. Inclusive, todos eles possuem suas peculiaridades, a relação entre os envolvidos é uma das melhores coisas de Cães de Aluguel. O filme se passa em poucos cenários, mas isso não importa já que a trama é realmente boa.
Veredito
Não é à toa que Reservoir Dogs, em seu título original, é até hoje considerado um dos melhores filmes de estreia de um diretor. Ele tem identidade, inspiração, carisma, ousadia, uma trilha sonora escolhida a dedo, atuações memoráveis, personagens marcantes e diálogos que ficam na cabeça. Nada parece fora do lugar e o final conclui perfeitamente o que vinha sendo proposto. Adicione o fato de que Cães de Aluguel é um filme independente e com pouco orçamento; o trabalho de Tarantino é de se aplaudir. A única coisa que senti falta mesmo foi de explorarem um pouco mais as figuras do Mr. Brown e do Mr. Blue, pois todos os outros tiveram um espaço considerável de tela.
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~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO O FILME. O AVISO ESTÁ DADO ~
- Eu já sabia que a orelha daquele pobre policial seria arrancada porque já tinha visto aquela cena em vários lugares diferentes, mas ainda assim é preciso reconhecer que é um momento chocante. Ver o Orange matando aquele fdp do Blonde me lavou a alma, mas o oficial da lei amarrado acabou morrendo de qualquer jeito, coitado.
- O filme não poderia ter terminado de maneira mais perfeita. No final das contas, o único personagem principal que sobreviveu foi o Pink, e ainda assim ele não teve um destino muito agradável. Eu pensava que tinha fugido com os diamantes, mas depois fiquei sabendo que dá pra ouvir no fundo o som dele levando tiro dos policiais e sendo preso em seguida. Resumindo, todo mundo se fodeu.
- Se você se acha o esquecido no churrasco, experimente ser o Mr. Brown ou o Mr. Blue. O marrom morreu do jeito mais estranho possível, levando um tiro na cabeça e morrendo de enxaqueca, pelo visto. O azul só falou umas coisinhas no começo, deu as caras em flashbacks e faleceu sem muita cerimônia.
- Curiosidade pra quem é louco por Trivia igual a mim: a Madonna gostou pra caramba do filme, mas mandou um recadinho pro Tarantino, dizendo que a interpretação dele de “Like a Virgin” tava errada. Era sobre amor, não sobre uma garota que encontra um cara bem dotado.
- O Orange é muito foda. Assumiu a bronca de ser um policial disfarçado, decorou uns causos daora envolvendo um pastor alemão, foi baleado e ainda teve culhões pra contar ao Mr. White que ele era um tira. O cara morreu por isso, é verdade, mas manteve os seus valores.
- Já que mencionei o Laranjinha levando chumbo, eu jurava que aquilo tinha sido combinado também, pra ele ganhar mais a confiança da gangue. Se for parar pra pensar, nada prova o contrário, já que ele pareceu atirar no ombro da motorista. Pode ser que aquilo tudo tenha sido calculado, sei lá, às vezes é pura viagem minha. E sei que não tem nada a ver com o assunto, mas nenhuma mulher apareceu no filme, né? As únicas que foram relevantes – a garçonete do começo e a piloto atiradora – nem mostraram o rosto. Curioso.
- Pensar que o Samuel L. Jackson fez testes pra participar da obra. Se isso tivesse acontecido, o ator teria participado de sete dos nove filmes do Tarantino gravados até então. Impressionante.
- Outra curiosidade pra vocês: o orçamento do longa era tão baixo que a galera usou os próprios ternos pra gravar as cenas. O mesmo aconteceu com o carro utilizado pelo Blonde. Isto é um tapa na cara de quem acha que filme bom precisa ter efeitos visuais eletrizantes e muito dinheiro aplicado. Nem sempre, meus caros. Nem sempre.
~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~
+ Melhor personagem: Orange
O elenco é reduzido, mas recheado de bons atores. Mr. White (Harvey Kietel) é um sociopata, mas demonstra ser um dos mais racionais do grupo. Mr. Pink (Steve Buscemi) é irritadiço, embora tenha sido o que agiu de modo mais profissional entre eles. Mr. Blonde (Michael Madsen) é um legítimo psicopata, protagoniza uma das cenas de tortura mais famosas do cinema. Mr. Brown (Quentin Tarantino) e Mr. Blue (Edward Bunker) não são aproveitados, mas Joe Cabot (Lawrence Tierney) e seu filho “Nice Guy” Eddie (Chris Penn), uma espécie de Jonah Hill dos anos 90, aplicam sua importância ao longo da obra. Porém, o que mais se destaca é o Mr. Orange (Tim Roth), que no começo eu pensei que seria o mais descartável. Cães de Aluguel reforçou em mim a ideia de que nunca é bom julgar um livro pela capa.
Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou da temporada. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?