Drama, Séries

13 Reasons Why: 4ª Temporada (2020)

• A importância de largar o osso

Recentemente, falei em meu Twitter que é questão de tempo até a Netflix perder o seu posto. Por ter sido a grande pioneira das plataformas de streaming, a empresa ainda tem muito crédito no mercado e com os consumidores, mas nenhuma supremacia dura pra sempre. A Amazon está chegando cada vez mais forte com a Prime Video, por exemplo. Prezando por qualidade ao invés de quantidade, a concorrente está com um conteúdo excelente, tanto nas séries quanto nos filmes. O design e a funcionalidade ainda precisam ser melhorados, mas em questão de títulos a Prime Video está começando a ameaçar um espaço que tinha uma dona isolada há anos. No Brasil, podemos citar também a Globoplay, que está investindo na adição de novelas, programas e séries próprias, além de obras famosas e ignoradas por outras plataformas. A Disney + também não está para brincadeira, os mundos da Marvel e de Star Wars já são pesados o bastante. Uma das razões pela possível queda futura da Netflix é justamente esse ramo mais disputado, mas não é o único fator. A insistência com séries que deveriam ter sido encerradas antes, em detrimento de outras com claramente mais potencial, pode vir a ser um tiro no pé. 13 Reasons Why é o exemplo perfeito disso.

 

Sinopse

Muito sangue foi derramado em Liberty High. Hannah Baker tomou a decisão de se suicidar, Jeff Atkins morreu em um acidente de carro, Bryce Walker afogou-se após ser agredido e empurrado por colegas de classe, Montgomery de la Cruz foi preso e morto na cadeia depois de ter violentado um garoto da escola, e por aí vai. Há alguma coisa sombria naquele colégio, pois tudo parece acontecer lá. Com tantas ocorrências, era de se imaginar que haveria pelo menos uma trégua no local, mas é claro que os roteiristas não permitiriam isso não foi o caso. O diretor da Liberty High, Gary Bolan, decidiu tomar algumas providências para instaurar a ordem em sua escola: os alunos passarão por revistas na entrada, câmeras serão instaladas e policiais vigiarão os corredores a todo momento. Enclausurados com tamanhas imposições, os estudantes se veem diante de uma pressão que tende apenas a aumentar.

Winston: “Você tem um minuto para ouvir a palavra de Monty?” / Tyler: “Todo dia isso, bicho, se fudê”

Crítica

13 Reasons Why utiliza um dos truques mais baratos para chamar a atenção do espectador. No primeiro episódio, é exposto um funeral, deixando claro que em algum ponto da história algum personagem irá morrer. O nome não é revelado, mas ficamos a par de que alguém vai partir desta para a melhor. Naturalmente, o primeiro pensamento que me veio à cabeça é que a trama seria ao redor daquilo. Uma marca registrada da série é dizer que algo vai acontecer em determinado ponto, mas não revelar detalhes. Com isso, cada episódio foca em uma pessoa diferente, a fim de levantar, confirmar ou eliminar suspeitas. Na primeira temporada, o mistério era sobre quem estaria nas fitas. Na terceira, era sobre quem havia matado Bryce Walker.
Porém, esse não é o principal enfoque da temporada. E qual é?, você me pergunta. Não sei, eu te respondo. A quarta temporada é um emaranhado de acontecimentos desconectados e bagunçados. Primeiro, eu pensei que o enredo se construiria em volta da morte de um personagem. Depois, a história desembocou nas consequências da morte de Monty, e a busca de seu amante Winston (aquele mesmo que foi agredido pelo próprio Monty, etc.) por justiça. Em seguida, a narrativa foi transferida para um indivíduo desconhecido deixando recados pela escola, como “Monty foi incriminado” na porta da sala do diretor. Posteriormente, a trama resolveu dar espaço para a situação de terror acarretada pela presença abusiva da polícia no colégio.
13 Reasons Why não sabe o que tá fazendo. Alguns podem dizer que a série não sabia desde o final da primeira temporada, e eu não discordaria. Contudo, na segunda temporada ainda tivemos elementos interessantes. A terceira foi um lixo, mas Justin Foley, Tyler Down e Tony Padilla salvaram as ações com arcos satisfatórios. A quarta foi complicada de ver em todos os sentidos. Eu poderia ficar o dia inteiro citando os defeitos, mas vou enumerar apenas alguns: a narração de Clay Jensen, recheada de reflexões imbecis e frases tão mal escritas que o Leleco de 11 anos sentiria vergonha alheia; personagens caricatos como Jessica Davis, a qual foi reduzida a uma militante de Twitter com gritos de guerra vazios; um roteiro perdido, que não sabe para onde andar e que inicia núcleos na mesma velocidade em que os ignora; uma experiência maçante na qual minha vontade era de desligar a TV e ir dormir; durações desnecessariamente GIGANTESCAS dos capítulos, com cerca de 1 hora cada um; personagens mortos dando as caras como alucinações; a excessiva ambientação carregada e depressiva e atletas que sempre aparecem na tela completamente uniformizados, seja em jogos, festas ou nas aulas.
Uma das poucas coisas que se salvam na temporada final de 13RW são determinadas atuações. Apesar de seu personagem ter sido o pior, Dylan Minnette (Clay) fez um excelente trabalho, entregando emoção mesmo quando os diálogos eram podres. Brandon Flynn (Justin) foi quase totalmente desperdiçado e os roteiristas encheram-no de trejeitos contraditórios, mas quando precisou ser exigido, mostrou o porquê de ser um dos mais talentosos atores do elenco. Os últimos episódios da temporada também não são tão ruins, em alguns momentos eu me vi realmente com vontade de saber o que aconteceria. Entretanto, não foi o bastante para apagar tudo de ruim mostrado anteriormente.

Alex: “O que foi, mano, tá tudo bem?” / Zach: “Não, cara, este roteiro tá me dando pavor”

Veredito

Horrível, horrível, horroroso, um espanto, me faz mal. Tomei a liberdade de pegar emprestado as palavras de Paola Carosella em um episódio de MasterChef para poder definir a última temporada de 13 Reasons Why. A história simplesmente não sabe aonde quer chegar, os diálogos estão entre os piores que eu já presenciei em toda a minha vida e a forçação de barra é tão grande que nos faz questionar por que a Netflix cancelou tanta coisa boa pra manter essa bomba. Os atores tentam fazer o possível para atenuar o desastre, mas está longe de ser o suficiente. A reta final da temporada consegue causar emoções e trabalhar algumas questões com uma certa qualidade, mas, novamente, está longe de ser o suficiente. Não adianta nada uma obra ficar relativamente boa no fim, quando tudo o que tinha sido exposto até ali fora absurdamente maçante. É uma pena que a saga de 13RW tenha acabado com um prestígio tão pequeno, tomara que sirva como alerta para a Netflix. Caso contrário, a concorrência vai chegar. Nota final: 1,4/5.

“Caraio, só tem chato ali atrás, vou é vazar”

 

>> Crítica da 1ª Temporada de 13 Reasons Why

>> Crítica da 2ª Temporada de 13 Reasons Why

>> Crítica da 3ª Temporada de 13 Reasons Why

 

Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco

Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco

Nota nº 3: bateu aquela curiosidade de saber qual exatamente é a nota das temporadas, sem arredondamentos? Se sim, dá uma olhada aqui nesse link. Se não, pode dar uma olhada também: Gabarito do Leleco

Nota nº 4: pra saber sobre quais séries e temporadas eu já fiz críticas no blog, é só clicar aqui: Guia do Leleco

 

~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO A TEMPORADA INTEIRA. O AVISO ESTÁ DADO ~

 

  • Que bosta de cruzada foi aquela do Winston? Vamos recapitular. Na temporada passada, ele foi agredido brutalmente pelo Monty. De alguma forma, acabou se apaixonando pelo garoto e teve um caso com o mesmo. Ignorando as acusações de que Monty teria violentado Tyler na escola, Winston ficou enlutado após a morte de seu amor na prisão. Ok, deve ter sido duro perder alguém querido, mas o que o povo do colégio tem a ver com aquilo? Entendo que eles colocaram injustamente a culpa da morte do Bryce nas mãos do Monty, unindo o útil ao agradável, mas mesmo que não tenha assassinado o amigo, ele ainda assim fez algo terrível com um menino inocente (isso considerando que Tyler foi o único). Desculpa, mas o Winston tinha que ter dado uma segurada.
  • Chatinho aquele Diego, hein? Só teve um momento em que eu senti por ele, quando o policial o segurou após a briga com o Justin. Quando é pra se elogiar, eu elogio, e aquela cena foi muito bem feita. Infelizmente, as autoridades dos EUA – não só de lá, mas enfim – são extremamente racistas, e aquela foi uma representação bastante fiel da realidade. Mas voltando ao Diego, o achei um porre do começo ao fim, tirando este episódio isolado.
  • Bicho, fiquei tenso demais durante aquele tiroteio. Eu tenho plena consciência de que a sequência inteira foi muito apelativa, mas não pude evitar de sentir o medo pela situação. Tinha tudo pra ser um episódio incrível, mas o fato de que aquilo tudo tinha sido um “treinamento” da polícia me broxou demais. Posteriormente, eu entendi o sentido, pra que ficasse mais do que claro a vazia obsessão da escola por segurança a qualquer custo, mas na hora foi decepcionante demais. E cá entre nós, o ator do Clay deu um verdadeiro show quando confrontou o diretor. O melhor (e único bom) momento do personagem na temporada inteira.
  • Seguindo a linha de fazer a gente viver o clima da série, o capítulo dos protestos conseguiu o que queria. Eu sentia que aquilo iria dar merda a qualquer momento, pensei que algum aluno ficaria gravemente ferido ou morto nas calçadas. Acabou que o ponto alto foi o Clay explodindo o carro do diretor.
  • Pegando o gancho do Clay, nos episódios finais ficou mais do que óbvio que ele tinha feito tudo aquilo, né? Se a intenção de 13 Reasons Why era fazer um plot twist, a artimanha foi mal-sucedida. E sei lá, não gostei muito de terem transferido todos os distúrbios possíveis pro personagem do Clay, fica parecendo que ele nunca conseguiria se livrar dos traumas. Aliás, isso é um contrassenso imenso da série: ela tenta passar um recado de otimismo e incentivar os jovens a procurar tratamento, mas tudo que expõe em suas tramas não passa de um pessimismo desesperador.
  • Namore alguém que te chame pro baile como o Charlie convidou o Alex. Se não for daquele nível, nem vale a pena namorar.
  • Os roteiristas não conseguiram decidir se queriam tornar o Zach um personagem bom ou ruim. Fazer com que ele se tornasse um alcoólatra por ter tido a sua possível carreira como atleta destruída foi uma jogada esperta, mas tudo aconteceu de maneira muito súbita. Ele era um dos mais equilibrados da série, e do nada tava lá sendo irresponsável. Acho que se tivessem feito essa degradação de modo mais sutil, Zach teria sido facilmente o Melhor Personagem da temporada. Em vez disso, ficou um pouco caricato.
  • Era quase natural que seria o Justin a morrer, na minha opinião. O Clay não morreria, porque é o protagonista. A Jessica também não, pois precisava passar o recado de superação. Se fosse o Alex, pareceria carma. A escolha mais previsível seria o Justin, e foi o que aconteceu. A surpresa pra mim foi o jeito como ele partiu. Eu pensava que seria um assassinato, ele morrendo na tentativa de salvar alguém ou algo do tipo. Não esperava que seria por conta de seu passado nas ruas. Toda a sequência dele no hospital foi forte, e não me envergonho em dizer que chorei. O problema foi que estenderam a morte dele até não poder mais, e o efeito acabou se perdendo um pouco. Eu só queria terminar logo a série.
  • O conselheiro de segurança da escola, Foundry, sendo gay e levando seu marido pro baile foi a parte mais surpreendente da temporada. Ah, e foi fofinho o Clay chamando a mãe pra dançar.
  • E pensar que o Diaz era um policial gente boa no final das contas. É verdade que não precisava ter ajudado a vigiar os alunos por meio de seus celulares, entre outras coisinhas, mas a intenção nunca foi vil.
  • Cena cringe da temporada: a Ani convidando a Jessica pro baile e cantando, com as garotas risonhas filmando. Eu tive uma vergonha daquela cena, quase fechei os olhos de constrangimento. Pelo menos a Ani teve menos momentos assim na temporada, porque antes tava foda.
  • O que fez menos sentido, o Tony querendo culpar o Tyler pelo “tiroteio” depois de sempre ter agido como protetor, ou o Justin pedindo pra Jessica ficar longe dele e surtando quando ela começou a ficar com o Diego? Disputa difícil.
  • A Courtney e o Ryan aparecendo no final foi algo legal de se ver. É claro que faltaram alguns retornos, como os da Sheri e do Sr. Porter, e principalmente da Hannah Baker, razão original pra existência da série. A cena em que ela apareceu não contou, porque claramente era uma filmagem antiga colocada ali. Porém, não julgo a atriz Katherine Langford, talvez eu também teria passado o mais longe possível daquilo. Nem a mãe dela quis voltar.

 

~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~

 

+ Melhor personagem: Robert Ellman
Foi o único da temporada inteira que eu não rolei os olhos em nenhum momento enquanto falava. Se ele foi o melhor mesmo aparecendo só nas sessões com o Clay, imagina se tivesse sido mais explorado.

“Beleza, fera, vou te mostrar como salvar esta bagunça de série”

+ Melhor episódio: S04E08 (“Acceptance/Rejection”)
O sexto episódio tinha tudo pra ser o melhor da temporada. Construiu muito bem a tensão (ainda que de maneira apelativa) e o Dylan Minnette deu um espetáculo de atuação. Porém, tudo foi desperdiçado com uma única decisão, a qual eu abordei nas Observações Spoilentas. Por isso, escolhi o oitavo capítulo como o melhor, por ter sido divertido e não ter estragado sua própria premissa.

“Ok, quem foi?”

+ Maior evolução: Ani Achola
Eu fui um dos maiores críticos desta personagem na temporada passada. Ela foi introduzida sem mais nem menos pra ocupar o papel de protagonista, e tinha o superpoder de estar em todos os lugares importantes exatamente na hora certa. Contudo, o meu problema era com a personagem, não a atriz. Se você foi uma das pessoas que entraram nas redes sociais da Grace Saif pra xingá-la por conta da personagem que ela interpretou, parabéns! Você é um lixo. Se for pra criticar, que direcione as reclamações pros verdadeiros responsáveis. De qualquer forma, a série diminuiu drasticamente a participação da Ani, o que eu pessoalmente achei algo bem covarde, assim como o que fizeram com Rose Tico na terceira trilogia de Star Wars. Pra mim, o certo era melhorarem a personagem, e não colocarem-na dentro da geladeira. Enfim, nos momentos em que apareceu, Ani esteve bem mais moderada, sem aquele ar de superioridade. Não chegou a ser uma personagem incrível, mas foi bem melhor do que na temporada anterior.

Ani: “Eu transfiro para você o peso de ser o pior personagem” / Clay: “obrigado, minha princesa, não vou te decepcionar”

+ Maior decepção: Tony Padilla
Ele havia sido um dos alentos da terceira temporada, mas estragaram o personagem. Tony passou a tomar algumas atitudes não condizentes com o que vimos dele até então, e perdeu totalmente o brilho de outrora.

Ted: “Seguinte, só ficar apertando quadrado que é sucesso” / Tony: “Do que você tá falando, cara?”

+ Mais subestimado: Charlie St. George
O Charlie foi um dos únicos da temporada a agir como uma pessoa normal, e que de fato poderia existir na vida real. Simples assim.

Diego: “Eu não acredito que tô vendo isso” / Charlie: “Ihh, alá, não é possível” / Justin: “Quem usa pochete em 2020, vei”

+ Pior personagem: Clay Jensen
É uma verdadeira pena quando o melhor ator da temporada é o mesmo do pior personagem. Tudo que circunda o Clay é tão preguiçoso que nem a ótima interpretação de Dylan Minnette é capaz de salvar a parte ruim. Na primeira temporada, o Clay foi o Melhor Personagem. Agora, ele foi o Pior. Isso simboliza bem 13 Reasons Why. A série passou de Vale a Pena pra Bom Entretenimento, depois ficou como Mais ou Menos e terminou sendo Perda de Tempo. Isso é que é uma involução.

“Aeeeee, fui o pior de todos!!”

 

Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou da temporada. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?

Publicado por Luiz Felipe Mendes

Fundador do blog Pitacos do Leleco e referência internacional no mundo do entretenimento (com alguns poucos exageros, é claro).