• Torta de climão
Eu nunca tinha visto tantas situações desconfortáveis assim em uma única série. Parece que todos os acontecimentos convergiam pra algo doloroso de assistir. Antes que eu seja mal interpretado, isso não é uma crítica, mas sim uma observação. Pra falar a verdade, foi uma característica bem marcante da segunda temporada de Love, Victor. Na vida, obviamente nos deparamos com situações assim. Vai dizer que você nunca ficou desconfortável quando aquela tia pergunta sobre os namoradinhos ou namoradinhas? Ou quando passa alguma cena erótica em um filme que você está assistindo com seus pais? Isso acontece com todo mundo, e foi bem legal a representação disso nesta obra que estou prestes a redigir a respeito. Simbora!
Sinopse
Victor Salazar não quer mais esconder a verdade. O garoto contou para seus pais e irmã sobre a sua orientação sexual, e cada um reagiu à sua própria maneira. Pilar respondeu com naturalidade, Armando se mostrou aturdido e Isabel ficou claramente em negação. Só o tempo irá dizer como os familiares de Victor responderão à revelação, mas ele tem ainda mais coisas com o que se preocupar. Agora que seus pais sabem, está na hora de mostrar o seu relacionamento pra escola inteira. Quais desafios Victor irá encontrar nessa empreitada? Como a sua vida social e pessoal será afetada por isso?
Crítica
A segunda temporada de Love, Victor é bem mais madura do que a primeira. Anteriormente, eu mesmo descrevi a série como repleta de clichês do gênero. Era uma produção adolescente, com todas as nuances presentes em obras do tipo. Aqui, as coisas já estão um pouco diferentes.
Normalmente, séries e filmes costumam trabalhar uma história de autodescoberta adolescente de uma maneira bem delineada. Primeiro, a timidez. Depois, um princípio de coragem. Então, o início de uma dúvida, seguida de perto por decisões equivocadas e pontos dramáticos. Por fim, o/a protagonista descobre mais sobre aquilo que deseja e age de acordo com tal definição. Raramente, vemos o que acontece depois. Como Love, Victor optou por deixar um gancho imenso para a segunda temporada, precisaria trabalhar intensamente os desdobramentos daquilo.
Confesso que eu tenho um pouco de medo quando uma série escolhe finalizar uma temporada no meio de um acontecimento impactante, interrompendo a cena pra nos deixar curioso pelo futuro. É difícil fazer isso dar certo, sobretudo quando a temporada seguinte ainda não está disponível. É uma jogada arriscada, pois assistir um ano depois ao desenvolvimento de uma trama interrompida pode não ser tão satisfatório, mas Love, Victor demonstrou esperteza. Em vez de dar um seguimento imediato à revelação de seu personagem principal, a série escolhe desenvolver lentamente cada reação presente na família de Victor.
O enredo faz isso de forma muito inteligente, não caindo em exagerados estereótipos ou caricaturas. Em alguns momentos, eu pensei que alguns arcos fossem se tornar muito previsíveis, mas consegui me surpreender por algumas curvas da trama. A relação entre Victor e sua mãe Isabel é um dos pontos mais fortes, pois representa muito fielmente algo muito comum em famílias. Além disso, a série trabalha bem quase todos os seus personagens. Felix e Lake ganham novos desafios como um casal, Armando tem a sua própria jornada, embora entrelaçada com a de outros personagens, Mia tem sua situação familiar abordada e a obra consegue, como um todo, dar caminhos sólidos para seus arcos.
O núcleo de Pilar foi uma das decepções. A personalidade da irmã de Victor está bem diferente, e sua história é pra lá de simplista e desapontadora ao considerarmos o potencial que ela poderia ter por si só, sem estar atrelada diretamente com outros. Já o Benji não consegue me convencer de jeito nenhum. Na primeira temporada, eu o achava apenas sem graça, mas passei a achá-lo irritantemente incômodo. As adições ao elenco fizeram bem à obra, mas algumas peças antigas, como o próprio Benji, acabaram por deixar algumas partes um pouco chatinhas. Não é que eu tenha problema somente com o personagem do Benji, só acho que ele não possui química nenhuma com o protagonista.
No mais, em geral me agradaram bastante as abordagens tomadas pelos roteiristas. A previsibilidade caiu bastante e os desenvolvimentos foram bem feitos, com poucas exceções. Uma delas me incomodou e forçou um pouco a barra, mas vamos ver se terá qualidade na próxima temporada.
Veredito
Love, Victor não é mais apenas uma série adolescente. Com muita sensibilidade, a segunda temporada trabalha temas como negação, amizade, transtornos psicológicos, preconceito, religião e coragem. Na maior parte do tempo, a história se mantém com um enfoque muito bem estabelecido, conseguindo dar o espaço necessário para todos os personagens. A maioria ganha mais espaço e personalidade, mas infelizmente outros acabam perdendo um pouco da moral. Contudo, a obra é capaz de ramificar os seus arcos sem distanciar-se demais de sua proposta central, e isso é bastante agradável de se ver. Nota final: 4,2/5.
>> Crítica da 1ª Temporada de Love, Victor
Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco
Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco
Nota nº 3: bateu aquela curiosidade de saber qual exatamente é a nota das temporadas, sem arredondamentos? Se sim, dá uma olhada aqui nesse link. Se não, pode dar uma olhada também: Gabarito do Leleco
Nota nº 4: pra saber sobre quais séries e temporadas eu já fiz críticas no blog, é só clicar aqui: Guia do Leleco
~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO A TEMPORADA INTEIRA. O AVISO ESTÁ DADO ~
- Antes de mais nada, só uma coisinha: assisti à temporada por um link em que as legendas estavam todas erradas, e isso fez com que a experiência ficasse um pouco engraçada. “Mi hijo”, por exemplo, virou “mijo”. Ok, agora vamos pra série.
- Isabel teve um arco muito bom, não acham? Ela começou se negando totalmente a aceitar seu próprio filho, e durante toda a temporada deu pra ver as engrenagens girando em sua cabeça e a opinião mudando as poucos. A sua rescisão com o padre lá foi o momento exato em que ela se tornou uma pessoa totalmente diferente, e o seu diálogo posterior com o Victor, na saída da boate, foi sensacional.
- O Armando me surpreendeu bastante. Eu já estava esperando ele ter uma reação agressiva ou algo do tipo, mas o cara foi o mais fofo possível. Entrou naquele clube de apoio, e foi legal ver o pai do Simon interagindo com ele. Gostaria que isso tivesse sido mais abordado pela série, inclusive. Seria massa de ver o Victor comentando com o Simon a respeito. A trama do Armando com a Isabel também achei muito bem desenvolvida e não pude deixar de torcer pelos dois juntos.
- Que nervoso eu fiquei com o episódio em que a galera vai pra cabana, mas foi bem engraçado. O Victor entrando em pânico e não conseguindo falar com o Simon, o Felix cortando as próprias partes e depois indo pro lago com a Lake do jeito mais poético possível… foi bem legal.
- Só a Mia que se ferrou, como sempre, né? Alguém dá um pouco de paz pra essa garota. Ela passou a vida viajando sem ter a oportunidade de formar fortes laços, sua mãe a abandonou há alguns anos, Mia descobriu que seu namorado era gay, pensou em voltar com o ex, mas ele já estava namorando outra, buscou outro garoto que era um artista enjoado que não trocou os pneus do carro pra não sujar as mãos, e ainda precisou arcar com a mentira do pai quando ele afirmou que iria abandonar a oferta de emprego em Stanford antes de ir lá e aceitar. Alguém dá um tempo pra Mia, pelo amor de Deus!
- Ainda bem que não cagaram muito na trama do basquete. A série poderia tranquilamente ter ido pelo caminho mais fácil e feito o Victor desistir de ser atleta porque na verdade ele não gostava do esporte, mas sim tinha sido influenciado pelo pai. Se isso tivesse acontecido, teria sido bem decepcionante. A toxicidade do ambiente esportivo em relação a minorias precisa ser abordado constantemente pra derrubar esse tipo de pensamento. E foi legal ver geral pintando o cabelo de rosa por sugestão do Andrew.
- Vamos falar sobre o Felix agora. Eu entendo totalmente ele ter ficado chateado com a Lake na situação envolvendo a mãe dele, e fez muito sentido pedir um tempo no relacionamento. Porém, o arco dele com a Pilar foi possivelmente a pior coisa da temporada. O interesse romântico dela surgiu completamente do nada, e seu núcleo foi totalmente reduzido a isso. Toda a sua história ficou fixada à do Felix, e isso diminuiu o tamanho da personagem. Mas enfim, continuando. Se tivessem feito a Pilar gostar dele e ele ficar confuso, até daria pra aceitar, mas o Felix ter decidido ficar com a Pilar em vez da Lake não fez sentido algum. A Lake fez uma declaração pública pra ele em frente à escola inteira, praticamente salvou a vida da mãe dele, foi a garota com quem ele teve sua primeira vez, os dois cuidavam demais um do outro… enquanto a Pilar assistiu a um programa de TV com o Felix. Não fez sentido algum, e terem colocado DO NADA um clima entre a Lake e a Lucy foi totalmente sem pé nem cabeça. Pode dar certo? Pode, mas foi muito repentino e artificial.
- Função do Adrian na temporada: ganhar uma tartaruga, reclamar dos pais quase divorciados e aceitar o Victor como ele é. Grande trajetória.
- Gostei que Love, Victor desviou um pouco da temática com o Simon, mas ainda assim não a abandonou completamente. Foi bem satisfatório ver o Victor tomando suas próprias decisões e avisando seu mentor que não precisaria mais da ajuda dele, mas tomara que se encontrem novamente no futuro. E o Simon ficou estiloso demais de barba, é algo que precisa ser dito.
- Ok, Benji ou Rahim? Me desculpem, mas não consigo gostar do primeiro. Ele tem a personalidade de uma parede e é totalmente mal escrito. Foi bem nada a ver aquele rolê de ele ficar zoando o lado atleta do Victor, sendo que o próprio Benji é super padrãozinho. Se ele fosse mais parecido com o estilo do Rahim, faria mais sentido, mas não foi o caso. Passei a segunda metade inteira da temporada torcendo pra ele e o Victor terminarem, a química do protagonista com o Rahim era muito maior, parecia ser uma relação bem mais saudável e o personagem é bem mais interessante. Tomara que o Victor o tenha escolhido, quero muito ver o desenvolvimento de ambos e ver como a série tratará a questão da família muçulmana do Rahim.
~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~
+ Melhor personagem: Isabel Salazar
Ela sempre possuiu muito carisma, mas o roteiro deu uma função diferente à mãe de Victor. Isabel representou todas as dúvidas sentidas por pais que descobrem sobre a verdadeira sexualidade dos filhos e se veem aturdidos. A sua trajetória foi um grande destaque na temporada.
+ Melhor episódio: S02E04 (“The Sex Cabin”)
A vibe que este capítulo passa é muito boa. Aquele clima de “primeira vez” é transmitido muito bem, e fez com que eu risse e me sentisse ansioso junto com os personagens.
+ Maior evolução: Felix Weston
Na primeira temporada, era basicamente o alívio cômico. Ele ainda continua com essa particularidade, é claro, mas ganhou MUITO mais camadas. Os seus dilemas com a mãe, sua insegurança com a namorada e o laço com o melhor amigo são excelentes. Aliás, a amizade entre Felix e Victor é uma das melhores que eu já vi na TV, falo com tranquilidade.
+ Maior surpresa: Rahim
Fiquei com a impressão de que ele seria apenas o “gay alegre e piadista” de Love, Victor, mas acabou se encaixando como uma luva na história.
Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou da temporada. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?