Marvel (MCU)

MCULeleco #26 – Eternos (2021)

eternos

• A Lenda dos Dez Fiéis

Uma verdade dita mil vezes se torna uma verdade. Não, acho que o ditado não é assim. Como é mesmo? Uma mentira dita mil vezes se torna verdade? Acho que é isso. Desde que a Marvel deu início à fórmula de dedicar cada filme de sua franquia a um personagem específico, a fim de desenvolvê-lo com mais cuidado, criou-se a narrativa de que todo filme de super-herói deve seguir esse modelo. Batman vs Superman, por exemplo, teria falhado porque optou por introduzir vários personagens de uma vez sem uma profundidade anterior. Eu discordo, e Eternos é uma prova disso. É possível sim apresentar vários personagens em uma só tacada. Contudo, pra fazer isso, é preciso ter um cuidado maior do que o habitual.

 

Sinopse

Os Eternos são praticamente deuses. Compostos por um grupo de dez seres superpoderosos, a existência dos mesmos é simples e objetiva: derrotar as ameaças dos Deviantes, criaturas propensas a um grande nível de destruição. Em qualquer outra ocasião, os Eternos não podem interferir por ordem superior. Mesmo quando aconteceu a Segunda Guerra Mundial, eles precisaram se conter. Mesmo quando Thanos dizimou metade da população, eles estavam de mãos atadas. Agora, porém, uma nova linha evolutiva dos Deviantes surgiu, e o grupo deve se juntar novamente, após séculos separados uns dos outros, para salvar a humanidade.

Com licença, Robb Stark, você poderia devolver o poder do Ciclope?

Crítica

Vamos por partes. Como eu pincelei lá na introdução, Eternos tem suas qualidades. A diretora Chloé Zhao, vencedora do Oscar por Nomadland, mostrou que é possível sim introduzir vários personagens principais em um único filme. Além disso, a escolha da produção por locações mais reais deu uma certa profundidade ao longa. O elenco recheado de nomes conhecidos apresenta um conceito pra lá de interessante. Ainda que possua as presenças de titãs como Angelina Jolie e Salma Hayek, a obra concentra suas atenções em artistas mais jovens, como Richard Madden e Gemma Chan.

Entretanto, embora seja teoricamente uma aposta subversiva e refrescante, o filme esqueceu de dar mais personalidade aos seus protagonistas. Druig é capaz de controlar mentes, e se vê em um dilema terrível por não poder evitar acontecimentos trágicos ao longo da História, obtendo um contorno de revolta pessoal e sistêmica. Phastos sofreu abalos marcantes quando participou indiretamente de catástrofes, escolhendo então construir uma família e tentar levar uma vida normal com seu marido e filho. Makkari é uma mulher surda que corre mais rápido do que frequentador de Black Friday. Sprite sofre diariamente por estar aprisionada a uma forma de criança, mesmo tendo milhares de anos. Thena vive os seus dias na iminência de surtos que afetam a si e àqueles próximos a ela, e Gilgamesh faz de tudo para protegê-la. Ajak é a matrona com muitos enigmas.

Todos esses personagens citados possuem uma coisa em comum: um potencial gigantesco de desenvolvimento. Infelizmente, a trama volta seu olhar para aqueles com os arquétipos mais familiares de todos. Sersi, a evidente protagonista, é uma garota insegura que encontra sua força com o passar do tempo. Ikarus é o líder a quem todos recorrem, e que possui uma considerável autoestima exagerada. Esses dois são os pilares da história. De maneira inversamente proporcional, muitas das melhores partes do roteiro ganham forma quando o foco está nos outros.

Embora eu tenha gostado da maioria dos personagens e achado que eles foram mal aproveitados, sendo que uns me agradaram mais do que outros, teve um que me incomodou. Kingo parece não pertencer ao universo de Eternos. Se ele estivesse inserido em Guardiões da Galáxia, talvez teria se encaixado perfeitamente com a vibe daquele grupo. Contudo, aqui ele simplesmente não funciona. Até o momento de seu aparecimento, o tom da narrativa era bem claro. Ainda que tivesse algumas partes de leveza, o discurso mais grave e sério dominava. A partir do momento em que Kingo deu as caras, a narrativa mudou drasticamente, o que causou um estranhamento absurdo. Pra deixar as coisas ainda mais esquisitas, o personagem sequer é utilizado no terceiro ato, o que me deixou ainda mais decepcionado com a sua inserção.

Eternos é um filme desbalanceado. Conceitualmente, ele é notável. A ideia de apresentar dez personagens importantes, a fotografia mais pé no chão, os bons efeitos especiais, a representatividade, algumas subversões narrativas e o lado visual da obra são grandes acertos. Entretanto, os defeitos se acumulam e acabam tomando mais espaço do que o esperado.

Chloé Zhao claramente dizendo algo como “respeita a mamacita ganhadora do Oscar e atua desse jeito aqui”

Veredito

Eternos é o 26º filme do Universo Cinematográfico da Marvel. Para exemplificar melhor o que eu achei do longa, basta escrever que ele seria Top 20 na minha lista de avaliações. Se eu der uma forçada, possivelmente conseguiria colocá-lo no Top 15. É uma obra que me entreteve enquanto eu assistia, me surpreendeu positivamente em determinados aspectos e me deixou curioso pela sequência da saga. A diversidade dos personagens e das locações é um ponto extremamente positivo também. Por outro lado, o desequilíbrio da narrativa, a incapacidade de firmar uma ideia até o fim, o antagonismo disperso e as apostas erradas nas figuras de protagonismo deixaram o filme em uma faixa mediana dentro do MCU.

Connie e Malévola, um crossover entre The Walking Dead e A Bela Adormecida

 

>> Crítica de Vingadores: Guerra Infinita

>> Crítica de Vingadores: Ultimato

 

Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco

Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco

 

~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO A TEMPORADA INTEIRA. O AVISO ESTÁ DADO ~

 

  • A galera responsável pelo roteiro deve ser muito fã de Game of Thrones, né? Contrataram Robb Stark e Jon Snow, e ainda pegaram uma personagem chamada Sersi. Só faltou o Tony Stark fazer uma aparição no filme.
  • Cara, possivelmente a Sprite foi a personagem com melhor construção. Não a mais agradável, mas pensando pelo lado dela, é um bagulho muito triste. Viver para sempre presa no corpo de uma criança? Pô, eu ficaria louco. Sei que ela podia mudar a sua forma e tal, mas devia ser um bagulho aterrador, ainda mais porque a garota era apaixonada pelo Ikarus. Fiquei com raiva dela no fim quando abandonou geral, mas deu pra entender o seu lado.
  • Pela primeira vez, o MCU teve uma cena de sexo, entre Sersi e Ikarus. Qual será o próximo passo da Marvel?
  • E por falar em passos importantes, a representatividade em Eternos é muito boa, velho. Tem gente de todos os tipos, e as características de cada um são abordadas de forma bem natural. O relacionamento de Phastos, a surdez de Makkari, sem falar nas diferentes locações ao longo da obra. Não tem mais só Estados Unidos. Tem Inglaterra, Iraque, terras da América do Sul… dá um frescor.
  • Tadinha da Ajak, ficou mais apagada do que tudo na trama. Ainda assim, foi paia a morte dela pelas mãos do Ikarus. Mostra que nem seres superpoderosos são imunes a devoções cegas perante missões supostamente divinas.
  • Gostei bastante da Makkari e do Druig, mas eles poderiam ter sido melhor explorados. Foi legal demais ver o filme dando espaço para uma língua de sinais, mas acho que daria pra ter ido além e dado mais personalidade pra Makkari. Quanto ao Druig, ele poderia facilmente ter sido um dos protagonistas, com um misto de herói e anti-herói.
  • Ai, que preguiça do Kingo e daquele mordomo dele, o Karun. Igual eu escrevi lá em cima, talvez tivesse sido divertido em outro filme, mas eu só queria que as cenas envolvendo ambos acabassem logo pra que a trama seguisse em frente.
  • Não esperava que tanta gente fosse morrer. A Ajak talvez, porque era a líder e tudo mais. Fiquei tristão com a morte do Gilgamesh, porque ele tinha bem mais a oferecer, acredito. A morte do Ikarus também fez sentido pelas circunstâncias da história, e foi massa vê-lo partindo rumo ao Sol como na mitologia grega. Foi interessante observar também que a dinâmica dos Eternos é muito mais caótica do que a dos Vingadores, por exemplo. Três morreram ao final do filme, um resolveu continuar na vida de ator, outra decidiu se tornar mortal, uma foi levada pelo Celestial Arishem e somente quatro sobraram, sendo que, com exceção da Thena, os demais não possuem muitas características de guerreiros.
  • Jurava que o Dane Whitman seria só um personagem humano aleatório sem muita importância geral, mas aparentemente o cara vai manejar uma espada poderosa lá. Essa eu quero ver.
  • Outra coisa que eu quero ver é como o Harry Styles vai se sair no MCU, com o papel do Starfox. Não consigo deixar de ficar empolgado com o futuro da Marvel, confesso.

 

~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~

 

+ Melhor personagem: Phastos
Normalmente, quando eu vou eleger este posto nas minhas críticas, tento deixar um pouco de lado a minha experiência pessoal para julgar qual personagem possui dilemas, características e desenvolvimentos melhores. Em Eternos, não tem muito como fazer isso. Pra mim, sinceramente não houve ninguém se destacando de forma singular acima dos demais. Possivelmente, a mais bem construída foi Sprite, mas não foi algo abismal em relação aos outros personagens. Por isso, vou eleger aquele que se tornou o meu favorito. Phastos é um cara marcado pela sua fé na humanidade, sofrendo uma desilusão traumática. A sua capacidade de enxergar o melhor nas pessoas, ao mesmo tempo em que lamenta as características mais sombrias delas, me deixaram bastante instigado e eu gostaria muito de ter visto mais dele no filme.

Um super-herói de gravata borboleta, nada mais estiloso do que isso

 

Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou do filme. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?

Publicado por Luiz Felipe Mendes

Fundador do blog Pitacos do Leleco e referência internacional no mundo do entretenimento (com alguns poucos exageros, é claro).