Drama

The Bear: 1ª Temporada (2022)

the bear

• Pesadelo na cozinha

Vocês já jogaram Overcooked? É um game super divertido, com potencial de destruir famílias e encerrar amizades. O objetivo do jogo, que se passa em uma cozinha, é entregar os pedidos a tempo, enquanto precisa se preocupar com cozinhar, fritar, lavar louça e não deixar as receitas pegarem fogo. Eleve essa experiência à décima potência e você terá The Bear. A série, disponível na Star+, traz como temática principal a realidade por trás dos restaurantes, principalmente aqueles com muita demanda. A primeira temporada funciona como uma minissérie, em uma história fechada. Contudo, o grande sucesso da obra lhe rendeu a confirmação de uma segunda temporada. Bom, acho que tô me adiantando. Vamos falar sobre a primeira temporada, pois é por isso que estou aqui.

 

Sinopse

Você sabe lidar com pressão? Consegue contornar problemas de ansiedade? É capaz de improvisar em um ambiente extremamente tóxico? Não? Então acho que o The Beef não é o lugar pra você. O restaurante de Chicago tá meio abandonado, é verdade, mas tem muita história por trás dele. Quando o dono do estabelecimento, Michael, tira a própria vida, cabe ao seu irmão, Carmen, revitalizar o lugar. Isso seria uma tarefa tranquila, tendo em vista que Carmen é um dos melhores chefs do mundo, mas não será tão fácil trazer o The Beef de volta à glória. Com funcionários desajustados e indisciplinados e problemas que vão desde o econômico ao comportamental, a reativação do restaurante promete ser osso duro de roer.

Você diria não a este homem?

Crítica

Eu nunca assisti a uma série igual The Bear, no sentido de transmitir a sensação agonizante de pressão. Eu acho que a última vez em que me senti tão ansioso enquanto via algo foi com o filme Argo, lá em 2012. Os episódios aqui são quase todos curtos, como se fossem parte de uma sitcom, mas de certa forma isso contribui para tornar o conjunto mais cansativo – no bom sentido. A gente, como espectador, sente o gigantesco desgaste que parece levar os personagens para além da imposição da rotina.

A fotografia é uma parte primordial desse aspecto. Através dos cortes rápidos, não apenas das facas dos cozinheiros, e de frequentes aproximações da câmera, a série transmite muito bem a sensação sufocante de que as coisas não vão dar certo, pelo menos não no tempo devido. E o melhor disso tudo é que a série não fica chata, porque não oferece só isso. Apesar desses momentos de pura loucura, o desenvolvimento dos personagens é delicado e cuidadoso, fortalecendo a relação entre eles e dando contornos das motivações e nuances de cada um.

Cada personagem tem um tempero especial a oferecer, com o perdão do trocadilho. Carmen é o carro-chefe de tudo, uma pessoa moldada pelos traumas e expectativas criadas sobre ele, e que precisa liderar uma galera que claramente não quer seguir ordens. Richie é o incômodo, pra não dizer palavra pior, que constantemente atrapalha o cotidiano com inconveniências que deixam a experiência ainda mais cansativa, se é que isso é possível. Sydney é a jovem cozinheira que quer se provar, contrastando com Tina, uma chef mais velha que não deseja sair da zona de conforto. Em termos gerais, alguns trabalhadores até demonstram vontade de evoluir, mas não é tão fácil se adaptar a um novo contexto de forma tão abrupta, ainda mais quando há uma tragédia envolvida.

The Bear, apesar de toda a pressão, é uma série engraçada. Não no sentido de Friends ou How I Met Your Mother, mas com um humor sarcástico colocado em partes específicas para adicionar mais pimenta à trama. Ao mesmo tempo em que a gente tá surtando com a iminência do fracasso, somos capazes de rir da forma irônica com que a história é conduzida. Essa mistura deliciosa chama a atenção e torna The Bear uma série única entre as demais.

Em termos técnicos, a equipe dos bastidores está de parabéns. A série é muito bem atuada, escrita e dirigida, todos os três pilares que praticamente garantem a qualidade de um produto audiovisual, algo que eu sempre menciono aqui no blog. Às vezes, eu nem percebo que estou assistindo a uma série ruim ou genérica até o momento em que topo com uma boa e original. E The Bear esbanja qualidades em uma história contida e que tem plena noção do que está fazendo.

Eu fingindo que tô anotando o que o professor fala

Veredito

The Bear não precisa de muita coisa pra brilhar. Na verdade, nem toda história precisa ser megalomaníaca pra ser boa. É possível que uma jornada de redenção dentro de um restaurante qualquer de Chicago seja um excelente panorama pra uma narrativa competente e criativa, contando com plena dedicação do elenco presente. A série é uma das grandes surpresas do início desta década, tão recheada de histórias requentadas e com falta de ambição. Ambição, inclusive, é um tema pra lá de presente em The Bear, e que demonstra muito bem como a pressão pode esmagar as pessoas de maneira desumana. Em meio a tudo isso, a experiência ainda consegue ser pra lá de divertida e cativante. Nota final: 4,7/5.

Mario e Luigi

 

Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco

Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco

Nota nº 3: bateu aquela curiosidade de saber qual exatamente é a nota das temporadas, sem arredondamentos? Se sim, dá uma olhada aqui nesse link. Se não, pode dar uma olhada também: Gabarito do Leleco

Nota nº 4: pra saber sobre quais séries e temporadas eu já fiz críticas no blog, é só clicar aqui: Guia do Leleco

Nota nº 5: sabia que eu agora tenho um canal no YouTube? Não? Então corre lá pra ver, uai: Pitacos do Leleco

 

~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO A TEMPORADA INTEIRA. O AVISO ESTÁ DADO ~

 

  • Ok, por onde começar? Vamos falar sobre o Michael. Fiquei surpreso quando vi que ele era ninguém mais, ninguém menos do que o Justiceiro, e só depois me dei conta de que o ator que interpreta o Richie também esteve na Marvel/Netflix. Achei que a série acertou em cheio ao moldar o personagem como alguém extrovertido, pois acredito que há muito esse estereótipo de que pessoas deprimidas necessariamente perdem a habilidade social ou algo do tipo.
  • Acho que falo por todo mundo quando digo que a Tina surpreendeu. Começou a série sendo um porre, e de repente virou uma das mais amáveis. O poder que um bom exemplo que tira o melhor de nós faz, não é mesmo?
  • Preciso desabafar uma coisa sobre a Sydney. Eu gostei dela, e adorava os momentos de interação com o Carmy. Porém, não consigo aceitar o fato de que ela agiu como se estivesse 100% certa na situação que culminou no seu pedido de demissão. Tudo bem que talvez o Carmy tenha passado do limite, mas é possível culpá-lo totalmente? A Sydney insistiu pra implementarem um sistema, e ELA MESMA foi quem fez o negócio errado e deixou em aberto dezenas de pedidos. A pressão naturalmente caiu toda em cima dele, que ainda tinha que lidar com a Sydney agindo como se ainda tivesse o direito de dizer alguma coisa naquele momento, e isso sem falar no Marcus insistindo em fazer uma “rosquinha perfeita” em meio ao CAOS total. Pelo amor de Deus, cara, aquela obviamente não era a hora certa pra estar fazendo aquilo.
  • Certo, acho que tô mais calmo. Essa série deixa a gente assim, sabe? O Richie tá aí pra não me deixar mentir. Como esse cara me irritou, Jesus Cristo amado. Sim, a gente acaba sentindo um pouco de pena dele por conta de todo o contexto de trauma e luto, mas não deixava de ser alguém problemático que mais atrapalhava do que ajudava. E ainda levou uma facada pra completar o pacote.
  • O Jeff Winger de Community agindo como um chef cuzão me deixou um pouco desconcertado, não vou mentir.
  • Mano, eu sei que não deveria, mas ri demais do episódio em que todas as crianças ficam sedadas e dormem no meio da festa de aniversário por conta do remédio que ingeriram. Aquilo foi demais pra mim.
  • Coisa linda o Michael deixando todo aquele dinheiro pra galera, mas confesso que fiquei meio confuso com aquilo tudo. Fiquei pensando que não adiantaria nada, porque a grana precisaria ser utilizada pra pagar o débito com o Cicero. Depois que fui refletir que, ao investir no restaurante, ele pode se tornar um lugar autossuficiente o bastante pra dobrar a renda e pagar o Cicero aos poucos. É a única coisa que faz sentido pra mim. Mas dane-se, foi legal demais a reviravolta. Só fico imaginando se tivessem jogado fora os tomates antes de abri-los.
  • O monólogo do Carmy, em que ele conta pro povo do grupo de AA sobre a relação com o irmão na infância, deveria render um Emmy automático pro Jeremy Allen White.
  • Curiosidade aleatória: o ator Pedro Henrique, de Chiquititas, cresceu e fez uma ponta na série como o filho adolescente da Tina. Eu jamais teria percebido isso, então dou os créditos pra minha namorada.
  • Não tinha nome melhor pra chamar o restaurante do que The Bear. Até porque o verdadeiro The Bear são os amigos que fazemos pelo caminho.

 

~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~

 

+ Melhor personagem: Carmen “Carmy” Berzatto
Jeremy Allen White interpreta um protagonista machucado, extenuado e traumatizado, que deixa tudo isso de lado pra poder gerir um restaurante. Diz muito sobre como a gente se leva ao limite simplesmente porque isso nos é ensinado, em meio a uma cultura prejudicial pra nossa própria humanidade. Grande personagem.

Burnout: A Série

+ Melhor episódio: S01E07 (“Review”)
Com um take de quase 20 minutos de pura explosão emocional, este não é apenas o melhor episódio de The Bear, mas o melhor episódio que eu vi em uma série em muito tempo.

Em busca da rosquinha perfeita

 

Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou da temporada. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?

Publicado por Luiz Felipe Mendes

Fundador do blog Pitacos do Leleco e referência internacional no mundo do entretenimento (com alguns poucos exageros, é claro).