• A caça e o caçador
Quentin Tarantino considera À Prova de Morte o pior filme de sua carreira. Não que ele o considere ruim, julga ter feito um bom trabalho e tem orgulho de seu produto, mas fazendo um comparativo com as demais obras, para ele esta figura na última colocação. Permita-me discordar de ti, cara. Pra mim, você caprichou e entregou um bagulho incrível. Bom, Death Proof (em seu título original) na verdade foi lançado em um DVD duplo chamado “Grindhouse”, em parceria com o também diretor Robert Rodriguez, com participações de Eli Roth, Rob Zombie e Edgar Wright. Planeta Terror é comandado por Rodriguez, enquanto À Prova de Morte é capitaneado por Tarantino. Não sei qual dos dois é melhor porque não assisti ao outro, e não tô aqui pra falar dele. Sem mais delongas, vamos à crítica.
Sinopse
Pensa numa premissa diferentona. Bom, a história é centrada em duas frentes temporais, mas não dá pra eu explicar mais que isso porque seria um spoiler cachorro. Por isso, vou me limitar ao ponto de partida da história. Três amigas estão viajando pelo Texas pra comemorar o aniversário de uma delas, que será num acampamento apenas pra garotas. No caminho, resolvem fazer uma parada em Austin pra encher a cara em um bar e tocar o terror. Mal sabem elas que tem um cara esquisito à espreita. Já não basta ele ser bizarro por natureza, com direito a uma cicatriz gigantesca no rosto e a velha desculpa do “cortei me barbeando”, o cara também é dono de um carro praticamente indestrutível por ser utilizado em cenas de dublês de TV. O perigo pode estar mais perto do que se imagina!!
Crítica
A primeira coisa que precisa ser dita nesta seção é sobre o estilo da filmagem. A direção de Tarantino é uma óbvia homenagem ao cinema dos anos 70, e ele faz isso da maneira mais literal possível. A fotografia parece ser de antigamente, assim como a ambientação e até mesmo o roteiro. A imagem surge muitas vezes riscada, o que causa um certo anacronismo quando nos deparamos com os rostos de atores contemporâneos. Porém, depois da sensação inicial de estranheza, a experiência ganha em riqueza.
Sabe aqueles diálogos longos e bem escritos que a gente tanto conhece? Você pode conferi-los aqui também. À Prova de Morte possui cenas extensas de conversas, e na maioria das vezes sobre algo trivial, do dia a dia. A estratégia traz naturalidade e humanidade, e não consegui deixar de me fascinar por tudo que era dito de maneira tão próxima da nossa realidade. Há um cuidado também na construção dos personagens. O antagonista vivido por Kurt Russell demora um pouco a aparecer de fato na tela, e o filme não tem pressa em introduzi-lo no enredo. Quando o faz, tem a plena certeza de que será com o máximo de impacto possível.
É um filme gostoso de se assistir. Ele não possui a ousadia latente de Pulp Fiction e não conta com sequências insanas de ação como em Kill Bill, mas capta a atenção e causa uma imersão que tá cada vez mais difícil de se ver no mundo cinematográfico. À Prova de Morte é aquele competidor que chega como quem não quer nada em uma maratona, mas acaba ficando entre os primeiros colocados. Tarantino ainda investe em reviravoltas e entrega uma conclusão perfeita para o que foi mostrado ao longo dos acontecimentos, sustentados por uma trilha sonora digníssima de nota. Observei os créditos subindo com um sorriso no rosto e a cabeça balançando levemente no ritmo da música.
Veredito
Subestimado ao extremo. Não sei por que ninguém comenta sobre Death Proof, sinceramente. Eu mesmo nunca tinha ouvido falar dele antes de iniciar a minha Sessão Tarantinesca. Em nenhum momento eu senti tédio, em nenhum momento minha atenção passeou por outros campos da minha imaginação. Ele não é cansativo, apesar de um início meio arrastado e aparentemente sem muito rumo, tem uma boa dose de diversão, uma fotografia saudosista no bom sentido, personagens carismáticos às suas próprias maneiras, uma narrativa fluida e um enredo redondinho, com o detalhe de ser o único filme do cineasta até hoje que começa e termina numa ordem cronológica. Se alguém me pedir recomendações daqui pra frente, À Prova de Morte estará entre os primeiros da lista.
>> A Sessão LelecoTarantino começou com Cães de Aluguel…
>> …e logo passou pelo icônico Pulp Fiction!
>> Pela primeira vez, pude acompanhar Jackie Brown,
>> e então conheci a história de Kill Bill, Vol. 1;
>> sua conclusão apenas no Vol. 2.
Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco
Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco
~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO O FILME. O AVISO ESTÁ DADO ~
- Só o fdp do Tarantino pra construir toda a relação entre as personagens lá do começo e do nada matar todo mundo sem um pingo de dó e com o máximo de crueldade imaginável. Na hora em que vi o Mike se aproximando com o carro e a Jungle Julia com a perna pra fora da janela, já vi que iria dar merda. Além disso, uma foi arremessada, outra foi esmagada e a última teve o rosto completamente destruído por um pneu. Literalmente, que morte horrível.
- Eeeeem compensação, que coisa maravilhosa aquele final. O dublê apanhando de todas as mulheres com 80345983495 socos seguidos e um chute fatality da Claire Temple no final foi a cereja do bolo. De repente o filme acabou, e realmente não precisava de mais nada. Aposentou no auge.
- Será que a Lee conseguiu se safar daquele molestador? E ah, curiosidade: é exatamente o mesmo personagem que tenta estuprar a Kiddo em Kill Bill enquanto ela tá supostamente em coma.
- E por falar nisso, os policiais que conversam sobre a situação do Mike depois de ele ter se chocado com as mulheres são os mesmos que encontraram a Kiddo na igreja, também em Kill Bill. MCU é o caralho, o melhor é o TCU, Tarantino Cinematic Universe.
- Adorei a forma como os dois grupos de mulheres do filme são quase iguais, mas o segundo era muito mais maluco, principalmente nas figuras das dublês (e ah, a atriz que faz a personagem que protagoniza o Mastro do Navio é realmente uma dublê na vida real, inclusive foi a da Uma Thurman em Kill Bill).
- O que será que aconteceu com o Chris lá da mensagem que a Jungle Julia tava mandando? Dúvidasidiotasquenuncaserãorespondidas.txt
- Pirei naquela sequência em que as mulheres estão conversando lá na cafeteria, com o Stuntman Mike atrás, sentado no balcão. Foi toda feita sem cortes durante uns seis minutos corridos, se não me engano.
- Sobre a cena do lapdance: bem executada, mas um pouquinho longa demais. E, já que toquei no assunto, o Tarantino tava taradão quando dirigiu o filme, né?
~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~
+ Melhor personagem: Kim (menção honrosa ao Stuntman Mike)
Eu quase coloquei o vilão como melhor, mas seria injusto se levarmos em conta que o filme tem como alicerce a força feminina. Pensando nisso, cheguei à conclusão de que ele ficou ainda melhor quando Kim, interpretada por Tracie Thoms, deu as caras pela primeira vez.
Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou do filme. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?