Crime, Nacionais

LelecoNacionais #04 – Cidade de Deus (2002)

cidade de deus

• Além do cartão-postal

Sem dúvida alguma, Cidade de Deus é o filme brasileiro mais influente de todos os tempos, em questão de alcance. Alguém discorda? É só olhar pra paixão nutrida por parte de público e crítica não só no Brasil, mas em outras partes do mundo. O filme chegou a ser indicado a quatro categorias no Oscar, e frequentemente aparece em listas de melhores filmes de todos os tempos. Dá orgulho, e é uma prova do quanto o nosso cinema nacional falha em alcançar todo o seu potencial de qualidade e também de exportação. Agora, bora pra análise!

 

Sinopse

Buscapé é um aspirante a fotógrafo na Cidade de Deus, longe dos cartões-postais do Rio de Janeiro. Lá, é cada um por si. Quando um bandido chamado Zé Pequeno começa a ascender no mundo do crime, isso trará inúmeras consequências – com Buscapé presente em meio a todo o caos, mesmo sem querer.

Que mecanismo interessante

Crítica

Cidade de Deus é, essencialmente, um filme de máfia. Claro, aqui não há personagens de ternos italianos, comendo macarrão, metralhando os próprios familiares ou arrancando cabeças de cavalos. O crime pode não ser organizado no sentido estrutural da palavra, mas, enxergando além das aparências e adequando aquela realidade ao contexto social brasileiro, é bem parecido.

A própria narrativa se assemelha a obras como Os Bons Companheiros e até mesmo Pulp Fiction, no sentido de que o protagonismo é bem mais relativo do que parece. Sim, Buscapé é quem conta a história, mas dá pra dizer que a trama gira em torno dele? O filme frequentemente se desenrola através dos olhos de Cabeleira, Zé Pequeno, Bené e Mané Galinha, mostrando a força de seu conjunto de personagens, sobretudo os masculinos.

Falta um pouco de protagonismo feminino, é verdade, mas tudo na vida é contexto. Estamos falando de um filme do início dos anos 2000, em um cenário majoritariamente de homens, no qual o poder simbólico e literal está nas mãos deles. Abrindo um parêntesis aqui, talvez a nova série baseada no universo do filme, produzida pela Max e que vai estrear em algum ponto de 2024, consiga potencializar essa questão.

Seguindo em frente, Cidade de Deus sabe bem o que contar e, mais importante do que isso, como contar. Em outras mãos, o enredo poderia parecer confuso e megalomaníaco. Porém, a direção de Fernando Meirelles e a montagem de Daniel Rezende dão a fluidez perfeita para destrinchar a história sem torná-la desfocada.

E as atuações – meu Deus, as atuações! Todo mundo do elenco tá excelente, desde os personagens principais até os atores mirins que aparecem em uma única cena. E a falta de “filtro” do filme é mais um diferencial. Se é pra mostrar violência, então que seja. Cidade de Deus não tem medo de mostrar o que deseja, mesmo se forem cenas controversas, como crianças levando tiros ou coisas do tipo. Essa abordagem nua e crua só enriquece a experiência.

O filme até começa a perder o fôlego em certo ponto da trama, mas é capaz de contornar o problema e concluir tudo de maneira sublime, fazendo valer a pena o tempo dedicado a ele.

Douglas Silva em seus tempos antes de BBB

Veredito

Não é à toa que Cidade de Deus possui tanto prestígio nacional e internacional. É uma verdadeira joia do cinema brasileiro, que se destaca em praticamente todos os seus elementos. Eu já tinha visto pela primeira vez lá em 2015, mais ou menos, e na minha revisitação eu o achei ainda melhor. Se você nunca teve a oportunidade de assistir, tire logo o atraso e tenha a plena certeza de que verá algo de alto nível.

Nada como um romance pra deixar a vibe mais tranquila

 

Nota: caso eu tenha usado algum termo desconhecido para vocês, meus queridos e queridas leitoras, não hesitem em acessar esse post aqui, ó: Glossário do Leleco

Nota nº 2: quer conhecer melhor a história do blog e os critérios utilizados? Seus problemas acabaram!! É fácil, só acessar esse link: Wiki do Leleco

Nota nº 3: pra saber sobre quais filmes eu já fiz críticas no blog, é só clicar aqui: Guia do Leleco: Filmes

Nota nº 4: sabia que eu agora tenho um canal no YouTube? Não? Então corre lá pra ver, uai: Pitacos do Leleco

 

~ OBSERVAÇÕES SPOILENTAS: NÃO LEIA A NÃO SER QUE JÁ TENHA VISTO O FILME. O AVISO ESTÁ DADO ~

 

  • Acho que se alguém fizesse uma “body count” (contagem de mortos) de Cidade de Deus, o número seria impressionante. E a maioria foi de personagens importantes batendo as botas. Se bobear, os únicos relevantes que ficaram vivos foram o Buscapé, o Cenoura e a Angélica.
  • Que atuação impressionante daquele menino cujo personagem levou um tiro no pé. E pensar que a instrutora de atuação o guiou pra pensar na pior dor que ele já havia sentido, que no caso era dor de dente, enquanto interpretava a cena. Ai.
  • O Mané Galinha é a personificação daquela frase do Batman: “ou você morre como herói ou você vive o bastante para se tornar o vilão”. O maluco foi de salvador da pátria a apenas mais um em uma guerra sangrenta. Que doideira.
  • Eu sei que o Bené era talarico, mas não tem como não ficar triste com a morte dele. E logo pelas mãos de um garoto que ele mesmo escolheu poupar. É aquela ironia poética que tanto fortalece uma história.
  • Um negócio que ficou muito na minha cabeça: qual é a sexualidade do Zé Pequeno? Eu sei que pode parecer um negócio meio besta de se perguntar, mas fiquei tentando desvendar esse mistério. Na minha opinião, ele tem traços de sociopatia que o impedem de ver o sexo como algo relacionado ao prazer. Mesmo assim, não me surpreenderia se ele fosse hétero, gay ou qualquer outro espectro da sexualidade. Qualquer uma das opções faria total sentido.

 

~ FIM DAS OBSERVAÇÕES SPOILENTAS. A PARTIR DAQUI PODE FICAR DE BOA SE VOCÊ AINDA NÃO VIU ~

 

+ Melhor personagem: Zé Pequeno
Qual é o primeiro personagem que te vem à cabeça quando falamos de Cidade de Deus? É bem difícil não ser o Zé Pequeno, né? Com uma atuação magistral de Leandro Firmino, o grande vilão do filme é um personagem extremamente complexo e rouba a cena em diversas ocasiões. E isso é dizer muito, considerando que ele está inserido em uma história recheada de ótimos personagens.

Zé Pequeno ensinando o Drew, de Todo Mundo Odeia o Chris, a atirar

 

Ei, você! Tudo joia? Pois é, eu também tô bem. E já que agora temos intimidade, comenta aí o que cê achou do filme. Opiniões são sempre bem-vindas, e é importante lembrar que nos comentários spoilers estão liberados. Se você não quiser vê-los, corre logo pra assistir e depois volte aqui, beleza?

Publicado por Luiz Felipe Mendes

Fundador do blog Pitacos do Leleco e referência internacional no mundo do entretenimento (com alguns poucos exageros, é claro).